Em um mundo obcecado pela perfeição, por filtros de redes sociais, a ideia de realçar falhas e defeitos pode parecer contra intuitiva.
No entanto, é exatamente essa a essência de uma filosofia que vem ganhando cada vez mais força, especialmente no design e na arte: a valorização da imperfeição como marca de beleza e de história.
Na frase “As rachaduras e os defeitos não são escondidos, são realçados” ecoa uma sabedoria milenar, desafiando nossa busca incessante por uma perfeição que, no fundo, é inatingível e estéril.
Essa filosofia encontra sua expressão mais pura no “Kintsugi”, a arte japonesa de reparar cerâmicas quebradas com laca misturada com pó de ouro, prata ou platina.
A técnica não apenas conserta o objeto, mas o transforma, dando-lhe uma nova vida e uma beleza singular.
As rachaduras, em vez de serem disfarçadas, tornam-se veios dourados que contam a história da peça, de sua quebra e de sua superação.
O objeto se torna mais valioso e único por ter sido quebrado.
O “Kintsugi” ensina que as cicatrizes não são algo a ser escondido, mas sim uma prova de resiliência, de que fomos capazes de nos reconstruir após a adversidade.
Além do Kintsugi, essa valorização da imperfeição se manifesta no Wabi-sabi, celebra a beleza da transitoriedade, da imperfeição e da incompletude.
Ele nos convida a encontrar a beleza nas coisas simples e envelhecidas, nas marcas do tempo em uma madeira, na assimetria de um vaso feito à mão.
Em um sentido mais amplo, essa filosofia nos oferece uma nova perspectiva sobre nós mesmos.
Tendemos a esconder nossas falhas, nossos erros e nossas cicatrizes emocionais como se fossem motivo de vergonha. No entanto, é nessas experiências que reside nossa verdadeira força.
As rachaduras em nossa alma são o que nos torna mais profundos, mais empáticos e mais resilientes.
Elas nos moldam e nos definem tanto quanto as nossas conquistas.
Ao abraçarmos a ideia de que rachaduras e defeitos não são escondidos, mas realçados, estamos fazendo uma escolha consciente.
Escolhemos a autenticidade em vez da perfeição.
Escolhemos celebrar a história por trás de cada falha e, mais importante, escolhemos enxergar a beleza não apenas no que é impecável, mas no que é único, imperfeito e, por isso mesmo, profundamente humano.
Marco Antônio de Figueiredo
Articulista