Em 1990, iniciei a produção de frangos de corte em sistema de integração com a então Companhia Ibirapuera de Avicultura (CIA). Em 1996, esta companhia foi colocada à venda. Fui então procurado por um conhecido integrado, com a proposta de se unir a mim e a um terceiro e comprarmos a referida empresa, por um valor aproximado de US$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil dólares), onde colocou “facilidades”: bastava hipotecarmos nossas propriedades e retirarmos o dinheiro necessário nos bancos para a compra.
Respondi ao integrado que deveríamos criar uma cooperativa de produção, inicialmente composta por vinte integrados, responsáveis pela compra, mas ele foi muito enfático, rejeitando a proposta. Neste intervalo, conversei com o colega cirurgião plástico José Fernando Borges Bento, conhecido pela sua prudência, habilidades em negócios e, na época, médico do trabalho da CIA.
José Fernando sempre soube se relacionar e tratar com muito carinho e respeito os mais idosos. Assim, tornou-se amigo pessoal do pai do Abílio Diniz, dono da CIA, que frequentemente vinha a Uberaba. José Fernando então me disse: “tenho aqui o telefone do pai do Abílio e posso falar com ele agora”. Porém, fraquejei, pois teria que impor ao integrado proponente que a proposta dele era inviável e assim teríamos que criar a cooperativa. Na sequência, a “Empresa Da Granja” (EDG) adquiriu a CIA que, alguns meses após, ficou claro que a venda foi barata, pois a CIA valia de duas a três vezes mais do que o valor pago por ela.
Pior: em 1998, a EDG adquiriu, com pagamento à vista, uma empresa de avicultura na Venezuela, por US$20.000.000,00, e, meses após, entrou com o pedido de concordata em Uberaba. Com esta jogada, atrasava o pagamento dos integrados por até um ano e, quando ia pagá-los, exigia um deságio de 40%, como fizeram com os integrados da época, mas não me atingiu, pois percebi antecipadamente a má-fé da EDG e passei a ser integrado da exemplar Empresa Rezende de Avicultura, que distribuía 10% de seu lucro líquido para seus colaboradores, e foi comprada pela Sadia, hoje BRFoods.
A finalidade de uma cooperativa é, acima de tudo: 1) oferecer condições de trabalho para seu cooperado; 2) remunerá-lo da melhor forma possível; 3) sobras para o cooperado, se possível, pois essa é a cereja do bolo.
Vemos hoje que as grandes empresas de avicultura do Brasil, seja a JBS (que adquiriu a Seara, que havia adquirido a EDG), seja a BRFoods (fusão da Sadia com a Perdigão), têm altos lucros, que não são repassados aos integrados, além de não terem a TRANSPARÊNCIA desejada, o que motivou uma passeata e uma audiência pública na Câmara dos Vereadores, em março de 2013, em Uberlândia, com dados muito bem levantados pelo José Gaspar, então presidente da Agritap (Associação dos Granjeiros Integrados do Triângulo e Alto Paranaíba).
Naquela data, José Gaspar também se posicionou contra o cancelamento repentino do contrato de 70 integrados de Monte Carmelo, produtores de peru, que foram estimulados 10 anos antes pela própria Sadia a produzir o peru em integração. Vê-se que a Sadia tem compromisso com seus lucros, mas não teve compromisso com seus integrados.
José Luiz Tejon, do agronegócio, informa-nos que as cidades com maior Índice de Desenvolvimento Humano são aquelas que têm mais cooperativas e mais empreendedores. O sistema cooperativista tem a função social de distribuição de renda entre seus cooperados.
Conclusão: confesso que em 1996 eu não tinha os conhecimentos da estrutura, organização e finalidades de uma cooperativa, como hoje tenho. Daí a necessidade de implantar a Disciplina “Cooperativismo” no Ensino Médio. Enfim, se arrependimento matasse…
Nilson de Camargos Roso
Doutor em Anestesiologia, professor aposentado pela UFTM
