O professor Aluízio era o médico infectologista brasileiro com mais nome e renome no exterior. É desnecessário relatar seus méritos e contribuições para as áreas da saúde e da densidade científica do mundo. Ele se transferiu para Uberaba em janeiro de 1987, oriundo da Universidade de Brasília, onde era Professor Titular de Infectologia. Lá construiu o núcleo de Medicina Tropical, através de verba doada pela fundação americana Walter Reed (US$500.000,00). Graças a ele, a Pós-graduação “stricto sensu” pôde ser iniciada na FMTM. Quando diretor da FMTM, eu me dirigia à Capes (Coordenação e Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior) e ao CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa), levando projetos elaborados por ele, e várias vezes ouvi “ótimo, pois o professor Prata está com vocês”. Todos sabiam que onde ele colocava sua assinatura era porque o projeto era sério. Graças a ele, a FMTM foi o quinto melhor curso médico do Brasil em 1997, segundo o “ranking” do DataFolha. Abordarei o seu “modus faciendi”.
Para ser um bom professor, é necessária a tríade de atributos: a competência, a dedicação (estar sempre disponível para o trabalho) e o desejo de ensinar. Conhecer administração, saber buscar fontes de recursos financeiros e trazer em uma mão o problema, mas trazer na outra a solução, eram atributos que o professor Aluízio também possuía.
Após se formar em 1945 na antiga Faculdade de Medicina da Praia Vermelha, hoje UFRJ, trabalhou por dois anos em Ponta Porã, MS, o que lhe deu traquejo em Clínica Geral e habilidade para se relacionar com populações diferentes.
Os argumentos e propostas dele nos convenciam pelas suas ações, mais do que pelas suas palavras, pois era um exemplo de cidadania. Não punia pelo erro, mas ensinava pelo erro. “Dar exemplo não é a melhor maneira de influenciar os outros. É a única”. (Albert Schweitzer). Por isso, ele era um educador e um formador de opinião. Exemplos.
Com mais de 80 anos, na ausência de plantonista para atender Infectologia no Pronto Socorro da FMTM, todos se assustaram quando, em período noturno, ele estava lá, bem-humorado, atencioso e prestativo.
Enquanto os demais professores formavam médicos, ele formava novos professores, que iriam formar novos médicos, ou seja, ele criava núcleos de excelência. Era o uberabense com maior número de horas de voo. Viajava para Itacarambi, norte de Minas, em projeto de pesquisa dos índios xacriabás, mas também para a Universidade de Marseille, na França. Outras vezes, viajava para Mambaí, GO, próximo às divisas de MG e BA, mas também para a Universidade de Cornell, nos EEUU.
Ele nos ensinou que “em público, se puder, elogie, e, se não puder, fique calado”. Também “se há uma aula previamente agendada, nada justifica a não aula”. Outra máxima: “se você deseja se relacionar bem com todos, divida as falhas das pessoas por 10 e multiplique as virtudes por 10. Se não deseja, faça o oposto”. Marcava, no final do ano, a fotografia com professores, alunos e servidores nas escadas da FMTM. Quem chegasse 5 minutos atrasado, não tinha a segunda chance.
Era um homem disciplinado e voltado para os valores e princípios que preservam a família. Era um cidadão do mundo, nunca falando em politica. Apenas trabalhava. Faleceu em 2011. Certamente, teria dificuldades para compreender e ser compreendido no Brasil de hoje, pois vivemos momentos de libertinagem, confundida com liberdade, com mudanças em nossa cultura (conjunto de tradições, conhecimentos, hábitos, experiências, normas e regras de um grupo social), pois “a cultura come a estratégia antes do café da manhã” (culture eats strategy before breakfast. Peter Drucker).
Otto von Bismarck nos alerta sobre a importância de pessoas exemplares: “com leis ruins e funcionários (cidadãos) bons, ainda é possível governar, mas, com funcionários (cidadãos) ruins, as melhores leis não servem para nada”.
Uma sociedade democrática, transparente, desejável, constrói-se com pessoas que possuem os atributos do professor Aluízio. Saudade somente ocorre pelas lembranças de pessoas que causaram o bem. Os meios acadêmicos e a sociedade em geral se ressentem da falta dele.
Nilson de Camargos Roso
Doutor em Anestesiologia; professor aposentado pela UFTM
n.roso@me.com