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Até quando deve (ou pode) o médico trabalhar?

Nilson de Camargos Roso
n.roso@me.com
Publicado em 19/04/2024 às 19:16
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O assunto é controverso, onde há situações bem definidas e outras inconclusivas. Os dados aqui relatados foram coletados da bibliografia canadense. Na terceira idade, há diminuição das acuidades auditiva e visual, da força muscular, da memória, da capacidade cognitiva, onde situações que exigem apurada atenção podem trazer dificuldades para o médico idoso enfrentar. É necessário haver eficaz desempenho das mãos daqueles que trabalham no centro cirúrgico (cirurgiões, anestesistas, enfermeiros). A ausência de habilidades manuais impede esses profissionais citados de trabalhar. Por isso, o lema: “o conhecimento está na cabeça, mas sai pelas mãos”. Acima dos 65 anos, 12% das pessoas apresentam algum grau de demência.

Sobre a idade:

1- Winston Churchill era primeiro-ministro do Reino Unido aos 81 anos, enquanto Nero, aos 26 anos, colocou fogo em Roma. Portanto, ser jovem não significa ser mais útil e produtivo.

2- Se estivermos na poltrona de um avião, aguardando a decolagem em um dia chuvoso e virmos chegar os dois pilotos, um de cabelos grisalhos e o outro jovem, de cabelos bem negros, surge a pergunta: o idoso é menos confiável por ser idoso ou o jovem é menos confiável por ser jovem? Neste exemplo não se pode dizer que a idade seja sempre preditiva de boa cognição e bom desempenho. Nos EEUU, a aposentadoria é obrigatória para pilotos aos 65 anos e no FBI é obrigatória aos 57 anos.

3- Em cirurgias de grande porte, como endarterectomia de carótida, implante de ponte de safena no miocárdio e duodenopancreatectomia, há melhores resultados quando os cirurgiões eram mais jovens. Este trabalho é claro e incisivo.

4- Estudaram as complicações ocorridas nas anestesias de dois grupos de anestesiologistas. Um grupo com idade superior a 65 anos e outro com idade inferior a 51 anos. Houve quantidade maior de complicações entre os mais novos. Porém, havia muito mais profissionais abaixo de 51 anos e poucos acima de 65. Quando feita a percentagem, os mais idosos, com poucos profissionais, tiveram 50% de ações litigiosas a mais e o dobro de eventos adversos. Aqui a idade foi decisiva.

5- Ferdinand Sauerbruch (1875-1951), cirurgião geral, operava em Berlim e era considerado um dos melhores do mundo. Aos 60 anos, apresentou frequentes mudanças súbitas de humor e períodos de esquecimento. Sugeriram sua aposentadoria, que não foi aceita. Tempos após, perdeu um conhecido ator em simples cirurgia de hérnia e, tempos depois, uma criança, durante cirurgia abdominal. Ameaçado com humilhante demissão, aposentou-se aos 74 anos. Este caso reflete bem a definição de ridículo: “condição em que somente o envolvido não percebe o que está ocorrendo”. 

Porém, o professor Zerbini operou bem até os 80 anos, quando então foi acometido por melanoma. Dr. Carlos Pereira Parsloe, o anestesiologista brasileiro de maior repercussão internacional, deu brilhantes palestras até os 90 anos.

Sugestões:
1- o médico idoso deve se ater a procedimentos menos complexos;

2- se há boa cognição, deve dar aulas e estabelecer protocolos;

3- trabalhar em horários nobres, onde há bom corpo clínico; 

4- ressalva: “a competência do idoso deve ser analisada mais pela idade funcional (boa cognição e bom estado geral) do que pela idade cronológica”.

O médico tem padrão alto na vida ativa e dificuldade financeira quando idoso.

O médico PODE parar quando há o desejo, associado à boa condição financeira, seja por ter aposentadoria pública ou porque fez um “bom pé de meia”.

O médico NÃO DEVE parar quando tem ainda bom preparo físico e mental, mas DEVE parar quando não tem mais essas condições.

O médico NÃO CONSEGUE PARAR quando ainda depende financeiramente do seu próprio trabalho, onde se esqueceu que um dia se tornaria um idoso aposentado.

É sempre necessário lembrar o momento de parar: “ou ACORDA (visão dos fatos) ou A CORDA (suicídio)”.

 Nilson de Camargos Roso

Doutor em Anestesiologia; professor aposentado pela UFTM

n.roso@me.com

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