Cada administrador deseja receber e repassar a empresa nas melhores condições. Este é o raciocínio sadio e democrático. No repasse de um cargo administrativo, em empresa pública ou privada, pode ocorrer várias situações, agradáveis ou não, entre aquele que assume o cargo (sucessor) e o que deixa o cargo (sucedido):
1) Primeira situação: é aquela em que o sucedido deixou o cargo, mas “a cabeça dele não deixou o cargo”. Assim, o sucedido está sempre presente na área administrativa da empresa, dando sugestões e dizendo o que pensa, constrangendo o sucessor;
2) Segunda situação: nesta, o sucedido, tendo um superego forte, afasta-se completamente, pois fica “receoso de estar interferindo na administração”;
3) Terceira situação: é a ideal, onde há confiança entre sucessor e sucedido e este repassa o essencial e se coloca à disposição para qualquer outra informação que o sucessor necessitar;
4) Quarta situação: é a pior possível, onde “o bicho pega” e o sucedido não repassa as informações, ou ainda, procura ocultar dados importantes, dificultando a administração do sucessor e ocorre quando sucessor e sucedido são desafetos. Neste exemplo, o sucedido age com perversidade, característica da Síndrome de Caim (inveja, vaidade e ódio). Tal conduta lembra o Rei Luís XV: “après moi, le dèluge” (depois de mim, o dilúvio), ou seja, não se incomodando com o futuro da instituição.
Em junho de 1989, ocorreu o processo sucessório na FMTM, onde eu ainda era o Diretor. Houve dois candidatos: professor Valdemar Hial e professor Édison Reis Lopes, este apoiado por mim, pois foi o meu braço direito e sempre colocou o bem comum acima de interesses pessoais, além de principal responsável pela implantação da pós-graduação. O eleito foi o professor Hial, que, mesmo não apoiado por mim, recebeu as condições abaixo que lhe facilitaram administrar:
Embora a posse do sucessor fosse ocorrer em 21 de outubro, em julho sai de férias e o sucessor passou a despachar junto com meu vice-diretor, professor Carlos Antônio Dib. Enfim, dois meses antes da posse, o sucessor já sabia o que ocorria na FMTM;
2- Tal fato ocorreu também no então Hospital Escola, que foi entregue totalmente abastecido de material e medicamentos;
A posse oficial do sucessor em Brasília ocorreu em setembro. Porém, pedi ao professor Hial que fôssemos um dia antes, onde, munido de caneta e uma caderneta, lhe repassei, indo de porta em porta, apresentando pessoas ligadas à administração do MEC, começando pelo sétimo andar e indo ao subsolo. Foram repassados os números das salas, telefones e secretários de cada setor: chefe de gabinete do Ministro, secretário particular do Ministro, secretário-geral do MEC, secretário de Educação Superior, Departamento de Orçamento e Finanças, Departamento de Ensino do Segundo Grau, Ciset (Secretaria Interna de Auditoria do MEC), Secretaria de Informática, Capes, DRH, Consultoria Jurídica, Codesfi (Conselho dos Diretores de Escolas de Ensino Superior Federais Isoladas), Crub (Conselho dos Reitores das Universidades Brasileiras), Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior), Conselho Federal de Educação e Ministério de Ciência e Tecnologia (CNPq). Estes dados permitiram ao sucessor antecipar conhecimentos que demoraria meses para obter.
Ao repassar à Funepu em janeiro de 1990, deixei em caixa ao sucessor US$1.150.000,00 (um milhão cento e cinquenta mil dólares), conforme histograma fornecido por Carlos Antonio Gomes.
Em 1993, retornei à Direção da FMTM. Aprendi muito cedo a lição dada pelo professor emérito Aluízio Rosa Prata: “em público, se puder, elogie. Se não puder, fique calado”. Por isso, não vou relatar as condições em que a FMTM foi a mim repassada em 1993.
Nilson de Camargos Roso
Doutor em Anestesiologia, professor aposentado pela UFTM
n.roso@me.com