ARTICULISTAS

Reanimação cardiorrespiratória e cerebral (RCRC)

Nilson de Camargos Roso
n.roso@me.com
Publicado em 01/09/2023 às 21:02Atualizado em 01/09/2023 às 21:02
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O primeiro curso de RCRC no Brasil foi em outubro de 1981, no Hospital da Bosch, em Campinas, São Paulo, organizado pelos professores da PUC/Campinas, Massami Katayama e John Cook Lane, onde estivemos presentes, assim como nos cursos seguintes, em 1985 e 1986. Peter Safar, um austríaco que migrou para os EEUU em 1949, especializou-se em Anestesiologia na Universidade da Pensilvânia e estabeleceu os protocolos de atendimento à RCRC em 1957, definindo Suporte Básico da Vida e Suporte Avançado da Vida, que persistem até hoje, obedecendo à ordem cronológica de atendimento, da letra A até a letra I, com revisões periódicas. No entanto, foi a Noruega que estabeleceu, há décadas, pela primeira vez os ensinamentos da RCRC às crianças pré-adolescentes e, depois, como pré-requisito para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Narro dois fatos ocorridos em Uberaba com RCRC.

PRIMEIRO FATO: era dezembro de 1981, domingo. Eu estava com minha família à beira da piscina do Jockey Park, quando uma sobrinha me disse: “tio, aquele homem está tirando uma criança que estava boiando na piscina”. Rapidamente, corri ao encontro daquele que retirava a criança. Era Reinildo Chaves Mendes, que me entregou a criança de 3 anos que havia afogado, com lábios cianóticos, manchas cadavéricas e pupilas em midríase. Constatada a parada cardíaca, iniciei as manobras de reanimação. Cerca de três minutos após houve o retorno dos batimentos cardíacos, sem o retorno da respiração, necessitando da continuidade da ventilação boca a boca. Cerca de quatro minutos após, a respiração retornou, mas necessitou que eu tracionasse a mandíbula (jaw thrust), pois a língua caía e obstruía a respiração. Em dez minutos, a criança estava chorando, reanimada. Dois fatos favoreceram essa reanimação, sem sequelas: certamente a parada cardíaca não foi superior a cinco minutos e a criança não tinha qualquer morbidade que dificultasse a reanimação. SEGUNDO FATO: Em 1983, uma aluna do quinto ano médico da FMTM estava dentro de seu carro, estacionado na Praça do Uberaba Tênis, aguardando, com o examinador no banco do carona, o início da prova prática de rua para a obtenção da CNH. O carro ainda estava estacionado. A motorista e o examinador se encontravam dentro do carro. De repente, o examinador notou que a motorista havia “apagado” e acreditou que ela havia adormecido. Porém, nos minutos seguintes o quadro ainda era o mesmo, o que obrigou o examinador a solicitar a presença de outras pessoas para auxiliá-lo. Solicitada a responder, ela se manteve inerte, concluindo que “ela não estava bem”. Como estavam a pouco mais de cem metros do Pronto Socorro do Hospital Escola (HE), ela foi transportada para este. Com diagnóstico de parada cardiorrespiratória (PCR), foi imediatamente intubada e manobras prescritas de reanimação foram realizadas. Como o coração é um músculo que responde bem aos estímulos, houve a reversão do quadro, mas como houve mais de dez minutos para o início do atendimento, o cérebro, ávido por oxigênio, pagou o tributo. Houve lesão cerebral. A causa da PCR: interação por medicamentos de ação cardiovascular, usados pela acadêmica. O HE foi inaugurado em janeiro de 1982 e ainda não estava adequadamente equipado em 1983, seja com material, seja com recursos humanos. Foi então improvisada uma UTI em enfermaria, onde a acadêmica ficou sob ventilação artificial. Nos dias subsequentes, a cada dia, os colegas de turma da acadêmica me procuravam, para corrigir falhas no tratamento da mesma, pois eu era o Diretor Clínico.

Conclusões:
1- os colegas da acadêmica já tinham acompanhado o tratamento de outros pacientes na improvisada UTI e nunca haviam se manifestado sobre as falhas na estrutura da mesma, o que é compreensível, pois os acadêmicos viam a colega como “família dos quintanistas de 1983”, o que sentimentaliza a questão;

2- há desconhecimento total por parte da população leiga do diagnóstico e do tratamento da PCR, sendo necessário, à semelhança da Noruega, treinamento desde a primeira infância, além do exame obrigatório de primeiros socorros para obtenção da CNH.

Os primeiros cinco minutos do atendimento ao paciente se chama “os cinco minutos de ouro”. Daí a importância do início imediato das manobras de RCRC. É necessário o treinamento onde cada cidadão possa ser “uma unidade coronariana avançada”.

Nilson de Camargos Roso
Doutor em Anestesiologia, professor aposentado pela UFTM
n.roso@me.com

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