Era o ano 2000 e eu era um dos diretores da Associação Brasileira dos Criadores de Girolando, entidade responsável pela criação e padronização desse gado leiteiro. Certa vez, após o término da reunião da Diretoria, como sempre, havia uma conversa informal. Sempre gostei de conviver e conversar com pessoas mais idosas, pois elas têm muito a nos ensinar. Esse enfoque surgiu do princípio chinês “se quiser vencer na vida, converse com três idosos”. Assim, conversava com vários produtores rurais. O mais idoso era o médico veterinário Argeu do Carmo Russo, responsável pela narração deste fato.
“Era o ano de 1955, quando fui solicitado por um técnico agrícola residente em Uberlândia, para orientá-lo a planejar e a estruturar uma granja com capacidade de 500 frangos de corte. Fui a Uberlândia e fizemos o que era possível na época, pois ainda não havia no Brasil grandes projetos para essa atividade. O jovem era técnico agrícola, formado pela Universidade Federal de Viçosa, e colocou em prática as orientações recebidas. Naquela época, todos nós estávamos acostumados a comer apenas o frango caipira. A aceitação inicial do frango de granja era uma novidade e, para se tornar costumeira, deveria ser implementada, inclusive com facilidades de venda.
Não havia na época a vigilância sanitária, o que permitiu ao jovem técnico vender frangos na via pública, onde eram pendurados no guidão de uma lambreta ou de uma bicicleta e a venda era anunciada na pura garganta, ou seja, feita aos gritos nas ruas ‘olha o frango de granja, tão bom quanto o caipira, porém mais barato’. Os anos passaram e o jovem técnico se mostrou um grande empreendedor.
Na década de 1970, conseguiu alavancar seu projeto, pois se tornou um grande fornecedor de matrizes para todo o Brasil, importando as ‘avós’ diretamente dos EUA, ainda pintinhos recém-nascidos, que chegavam ao Aeroporto de Viracopos, em Campinas, e eram transportados em caminhão baú, com temperatura controlada, até Uberlândia. Estas ‘avós’ produziam as ‘filhas’, que eram distribuídas por todo o Brasil e que, por sua vez, produziam os ‘netos’, que eram os frangos que iam ao abate.”
Em dezembro de 1997, fui visitar a empresa criada por esse empreendedor, onde passei a ser integrado a partir de janeiro de 1998.
Percorremos os setores:
1- setor da saúde, com seus diversos profissionais;
2– manutenção da qualidade de todos os veículos (carros e caminhões);
3- fábrica de rações;
4- setor de integração;
5- incubatório, onde “a admissão de qualquer pessoa obedecia a um rigor maior do que quando se entra no centro cirúrgico de um hospital” (palavras textuais do Dr. Adib Jatene, ao visitar este incubatório);
6- planejamento: previsto para os próximos cinquenta anos;
7- seção especial para produção de ovos destinados às pesquisas, onde o ovo produzido sem anticorpos era vendido a US$1,0 (um dólar), cada um;
8- abatedouros de frangos e de suínos;
9- os colaboradores recebiam 10% do lucro líquido da empresa, melhor do que o PPR (programa de participação nos resultados).
Fui integrado produtor de frango de corte nessa empresa, de 1998 a 2003.
No final de 1999, a empresa foi vendida para a Sadia, por 155 milhões de reais, o que foi um retrocesso irreparável para o produtor rural triangulino, pois houve não apenas perda de melhor remuneração ao integrado, mas a falta de transparência das ações da nova empresa foi o ponto mais negativo, o que motivou meu retorno como integrado à “Da Granja”, em Uberaba. A não transparência da Sadia gerou audiência pública dos integrados com os vereadores, em março de 2013, onde estive presente, ocorrida na Câmara dos Vereadores de Uberlândia, coordenada pelo presidente da Agritap (Associação dos Granjeiros Integrados do Triângulo e Alto Paranaíba), o uberabense José Gaspar.
O motivo da venda para a Sadia foi a discordância e o consequente desentendimento entre o proprietário e a esposa. O nome deste técnico agrícola é Alfredo Rezende, criador da megaempresa “Granja Rezende”, onde sua visão de futuro e de negócios dependeu apenas dele, empreendedor, à semelhança do técnico em mecânica Henry Ford, criador de um império automobilístico nos EUA.
Nos países de Primeiro Mundo, 35 a 38% dos alunos que terminam o segundo grau são técnicos, enquanto no Brasil, apenas 11%. A pirâmide da Educação brasileira está de cabeça para baixo: o governo federal gasta mais com o Ensino Superior do que com o Ensino Fundamental. Daí formarmos analfabetos funcionais.
Os fatos aqui citados comprovam que o sucesso do empreendedor não guarda relação com a graduação em Ensino Superior, havendo um conceito no Brasil que deve ser claro: para ser empreendedor vencedor não é necessário ter curso Superior. Tudo depende de nós, do que fizermos e do que não fizermos.