OLGA MARIA FRANGE DE OLIVEIRA

Bento XVI – um gigante da Fé e da Razão

Olga Maria Frange de Oliveira
Publicado em 12/01/2023 às 18:48
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Fiquei extremamente abalada pela morte do Papa Emérito Bento XVI, por quem sempre tive uma grande admiração e respeito por toda a sua trajetória de vida. Há poucos dias, recebi farto material sobre o papa Bento XVI das mãos de uma grande amiga, D. Vanda Elisabete Ribeiro da Silva. Decidi, então, escrever este artigo sobre este expoente máximo da Igreja Católica, para dividir com os leitores preciosas informações sobre esse homem que colocou a sua vida a serviço da Igreja.

Joseph Aloisius Ratzinger nasceu em Marktl am Inn, município alemão situado na Baviera, perto da fronteira austríaca, em 16 de abril de 1927. Nasceu num Sábado de Aleluia e foi batizado no dia seguinte, domingo de Páscoa. Em sua mocidade, testemunhou a maior crise da modernidade, marcada pela ascensão do nazismo e pela devastadora destruição provocada pela Segunda Guerra Mundial. Iniciou sua carreira eclesiástica em 1939, quando ingressou no seminário-menor em Traunstein.

Em 1943, aos 16 anos, Ratzinger foi incorporado ao Exército alemão pelo alistamento obrigatório, onde vivenciou uma traumática experiência. Em torno do jovem seminarista havia uma atmosfera de crepúsculo dos deuses, a mesma que envolvera Santo Agostinho, ao testemunhar as sucessivas invasões ao Império Romano, que culminaram no episódio sangrento do saque de Roma pelos visigodos, em 24 de agosto de 410, liderados por seu rei Alarico, com três dias de barbárie, assassinatos e pilhagem. Da mesma forma, Ratzinger se questionaria, séculos depois, ao visitar o campo de concentração de Auschwitz, no sul da Polônia: “Onde estava Deus?”

Segundo ele, “A razão tem sempre necessidade de ser purificada pela fé; e isto vale também para a razão política, que não se deve crer onipotente. A religião, por sua vez, precisa sempre de ser purificada pela razão, para mostrar o seu autêntico rosto humano”. Para Ratzinger, a ruptura deste diálogo implica um alto custo para o futuro da humanidade.

Em 1951, os irmãos Georg e Joseph Ratzinger foram ordenados padres. Em 25 de março de 1977, Joseph foi nomeado arcebispo de Munique pelo papa Paulo VI, tendo sido, neste mesmo ano, elevado ao posto de cardeal. Dessa forma, em 1978, participou do conclave que elegeu João Paulo I, logo seguido do conclave que elegeu o papa João Paulo II.

O cardeal Ratzinger foi eleito para a sucessão de João Paulo II, em 19 de abril de 2005. Tornou-se o 265º papa, obtendo o apoio da maioria absoluta dos cardeais. Seu papado durou de 2005 a 2013. Durante seu pontificado, ele esteve no Brasil de 13 a 21 de maio de 2007, na V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e Caribenho, realizado no Santuário de Nossa Senhora Aparecida (SP). Na oportunidade, procedeu à canonização de Frei Galvão, que se tornou o primeiro santo brasileiro da Igreja Católica. Dessa maneira, ele deixou sinais imperecíveis de sua passagem pelo nosso país, em sua inesquecível estada no Mosteiro de São Bento, no coração de São Paulo, que o recebeu com a hospitalidade carinhosa que a comunidade paulista soube lhe oferecer.

Como Sumo Pontífice da Igreja Católica, manteve sua postura de conservador convicto e rejeitou todas as tentativas de mudança na doutrina moral da Igreja. Entre outros temas, defendeu o direito à vida desde o começo da concepção, a indissolubilidade do matrimônio, o celibato dos padres e o sexo exclusivamente dentro do casamento. Bento XVI opôs-se a todas as pautas consideradas progressistas, inclusive a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Ao mesmo tempo, nunca se negou a dialogar com quem divergia de suas ideias. Em 2013, Bento XVI surpreendeu o mundo ao renunciar ao papado. Foi um gesto insólito, especialmente para quem era considerado o grande guardião da tradição. Desde a renúncia, Bento recolheu-se num mosteiro, aparecendo em público pouquíssimas vezes.

Além de teólogo, o Papa Emérito Bento XVI dominava seis idiomas e foi um exímio pianista e organista. Profundo conhecedor da música erudita e da música sacra, escreveu em 2017, aos 90 anos, o livro “O Espírito da Música”, obra expressiva que mostra mais uma contribuição de Bento XVI para a Igreja Católica e para toda a humanidade. Trata-se de uma coletânea de textos escritos, com grande sensibilidade musical e profunda fundamentação bíblica, por esse sábio, cognominado o “Mozart da Teologia”.

Bento XVI morreu aos 95 anos, no apagar das luzes do ano de 2022, em 31 de dezembro, no Mosteiro Mater Ecclesiae, no Vaticano. Alguns dias antes de sua morte, ele assim se expressou: “Encontro-me diante do último trecho do percurso da minha vida e não sei o que me espera. Contudo, sei que a Luz de Deus está presente, que Ele ressuscitou, que a sua luz é mais forte do que toda a obscuridade, que a bondade de Deus é maior do que todo o mal deste mundo. E isto ajuda-me a prosseguir com segurança!”

Uma semana antes de seu falecimento, Bento XVI deixou-nos um pensamento que traduz fielmente a sua profunda fé em Deus, inabalável até seu último suspiro: “Estou preparado não para a partida, mas para o encontro!...”

A partir de 1º de janeiro de 2023, durante três dias de velório, cerca de 200 mil pessoas foram à Basílica de São Pedro para se despedir do Papa Emérito. Na quarta-feira, após o encerramento do velório, o corpo de Bento XVI foi colocado num caixão de madeira de cipreste, em uma cerimônia que também ocorreu no interior da Basílica. Na quinta-feira, 5 de janeiro de 2023, cerca de 50 mil pessoas acompanharam a belíssima cerimônia fúnebre celebrada pelo papa Francisco, em cadeira de rodas, na Praça São Pedro do Vaticano, transmitida para todas as partes do mundo.

O Papa Emérito Bento XVI é considerado o mais importante teólogo e intelectual da Igreja Católica dos tempos hodiernos, tendo se revelado um homem de espiritualidade profunda e inspiradora. Foi um intelectual inquieto, em constante diálogo sobre a verdade.

Requiescat in pace, Benedictus!

 Olga Maria Frange de Oliveira

Professora de piano; autora dos livros “Pioneiros da História da Música em Uberaba” e “Mulheres na Música”; ocupa a cadeira n.º 15 da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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