Meu amigo Jorge, nunca pensei que seu afastamento do Jornal da Manhã fosse me deixar tão abalada, tão sem chão, tão sem ter com quem dividir o pouco que amealhei ao longo da minha trajetória. Aliás, nunca pensei que um dia sua coluna fosse acabar. Será que a pandemia precipitou essa decisão? Penso que não, porque na crise que estamos vivendo sua coluna ganhou mais profundidade, mais reflexão, mais densidade, mais sabedoria, mais gosto de quero mais. Você se reinventou mais uma vez. São tão raras as pessoas que cultivam o interesse pelo ser humano, pelas tradições culturais, pela defesa dos valores que realmente importam! Para mim, nossas tradições constituem a seiva que corre através de nossos canais históricos e espirituais.
O nosso convívio ao longo de tantos anos fez com que, mesmo que não nos víssemos com frequência, eu tivesse a sensação de estarmos sempre próximos através dos seus textos. Sempre comecei a leitura do Jornal da Manhã pela sua coluna para depois voltar ao início e conferir os demais tópicos. Era quase um ritual!
O amor às manifestações culturais, sejam elas de qualquer natureza, era um ponto em comum. Desde que me entendo por gente, lembro-me de você dizer que, nos fins de semana e feriados prolongados, o seu lazer favorito era caminhar pela cidade, pelos subúrbios de Uberaba, conversando, anotando, fotografando, pesquisando, nutrindo-se da sabedoria do povo, redescobrindo sítios esquecidos pelas gerações que foram chegando e que estavam atarefadas demais para se debruçarem sobre o passado. Você aprendeu cedo que a vida tem que ser sorvida não como uma taça que se esvazia, mas que se renova a cada gole. E foi assim, sem nenhum alarde, que o seu olhar de poeta começou a descobrir a alma de Uberaba. A desvendar seus mistérios...
Quero lhe dizer, meu amigo, que considero você uma pessoa de múltiplos talentos e com invejável cultura geral. Em prosa ou em verso, encontro na sua produção literária o delicioso sabor provinciano de nossa Uberaba, misturado à paisagem agreste que caracteriza nossa região, rural por excelência, bem como a malemolência e sensualidade típicas de nosso clima quente e árido. Tudo isso numa linguagem muito pessoal decorrente de um inegável poder criativo aliado a uma foça expressiva inovadora.
Você, sem querer, tornou-se muito mais que um colunista social, utilizando seu espaço no jornal também para se tornar porta-voz dos agentes culturais, uma voz respeitada que encontrava eco no seio da comunidade. Conhecimentos gerais são adquiridos ao longo de uma vida inteira, desde que se tenha interesse e disposição para tal. E isso você tinha de sobra!
Amigos são bençãos que devem ser cultivadas com carinho, respeito e consideração. E lembre-se que cada dia, cada hora, cada momento é outro começo, outra oportunidade, outra chance de se recriar. Obrigada por ter divulgado meus releases, comentado minhas conquistas, registrado momentos importantes da minha vida. Obrigada por ter espalhado as sementes que germinaram e enriqueceram diferentes segmentos culturais. Obrigada pela sua amizade de irmão de fé. Obrigada por ser quem você é.
A sensação de missão cumprida não há de servir para se deitar em cima dos louros conquistados. Ainda há muito o que fazer.
E, por favor, sonhe mais, e nos leve a sonhar com você.
Olga Maria Frange de Oliveira - professora de piano, regente do Coral Artístico Uberabense, autora do livro Pioneiros da História da Música em Uberaba e ex-diretora geral da Fundação Cultural de Uberaba.