ARTICULISTAS

Pelos caminhos da Arte

Em 1986 eu conheci uma família muito especial. Nessa época, eu trabalhava no Instituto Musical

Olga Maria Frange de Oliveira
Publicado em 14/06/2018 às 21:07Atualizado em 17/12/2022 às 10:34
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Em 1986 eu conheci uma família muito especial. Nessa época, eu trabalhava no Instituto Musical Uberabense, que funcionava em prédio do Colégio Nossa Senhora das Dores. O casal Vanda e João Ribeiro da Silva, recém-chegado de Belo Horizonte, matriculou suas três filhas nos cursos de piano e flauta doce. As meninas eram encantadoras: Raquel Elisabete, que tinha um natural porte aristocrático; Débora Elisabete, delicada como uma flor, tímida e franzina; Simone Elisabete, de olhar curioso e um jeitinho sapeca. Estudaram com a professora Marilda de Carvalho Frange e, durante 4 anos e meio, revelaram talento e musicalidade.

Interrompendo seus estudos musicais, Débora resolveu estudar pintura na “Escola de Artes Dr. Odilon Fernandes”, como aluna da professora Dulce Fernandes A. Ferreira. Paralelamente, teve aulas de pintura em aquarela com a saudosa artista Maria Helena Pinto Cruz.

Como a família era natural de Belo Horizonte, era compreensível a decisão da jovem Débora de fazer os estudos superiores na capital. Lá, ela optou pelo curso de Licenciatura Plena em Arte-Educação e Bacharelado em Artes Plásticas na Universidade Estadual de Minas Gerais. Após a conclusão do curso, em 1999, decidiu fazer uma Especialização em Patrimônio Cultural e Musealização, pela PUC/BH/MG.

No mesmo período, resolveu estudar dança e se entregou com paixão a essa nova forma de se expressar. Em 2009 chegou a se classificar em 1º lugar num concurso de “Dança de Salão” realizado em Belo Horizonte, como dançarina de tango, interpretando o imortal tango “La Cumparsita”.

Ao concluir o curso na PUC, em 2005, um novo ciclo se iniciou. Nossa jovem artista se capacitou para atuar numa área onde militam poucos profissionais, e que exige um talento diferenciado e uma grande precisão técnica.

Hoje, a pequena/grande Débora exibe um currículo invejável que a coloca entre os melhores restauradores do país. Dentre os trabalhos realizados em Uberaba dois se destacam: 1- Restauração de todo o acervo do Museu da Capela do Colégio Nossa Senhora das Dores; 2- Restauração do tríptico das imagens de São Domingos, Santa Catarina de Senna e Nossa Senhora do Rosário, da Igreja São Domingos. Doravante seu nome estará vinculado a obras relevantes do acervo artístico-cultural da Ordem dos Dominicanos de nossa cidade.

Fora de Uberaba um sem-número de trabalhos consolidou o seu prestígio no setor, dentre os quais constam: Restauração dos quatro altares laterais da Igreja Matriz de São José, em Florianópolis (SC); Recuperação da policromia do Altar-Mor e dos Altares Laterais da Igreja e Santuário de São Francisco de Assis, no Largo de São Francisco, em São Paulo; Reintegração e reprodução estética do “stencil” grego no entorno da claraboia do “Pantheon dos Andradas”, em Santos (SP); Recuperação das cimalhas e frisos de madeira do salão principal de exposições do Museu Mineiro, em Belo Horizonte (MG); Restauração para o IEPHA (Instituto de Estudos e Pesquisas do Patrimônio Histórico e Artístico), de Belo Horizonte, de uma imagem de Nossa Senhora de Lourdes, em madeira policromada, pertencente ao município de Congonhas do Campo.

O último e importante trabalho de restauro, recém-concluído, foi o de uma imagem de Santa Bárbara, de 1,70 m, esculpida em madeira de cedro. Vinda de Portugal com os descobridores, esta peça pertence ao acervo da Fortaleza de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, a primeira construída no Brasil, na Baía de Guanabara, em 1555. A estátua estava em estado lastimável. Após três intervenções com resultados desastrosos, decidiram recorrer à nossa artista uberabense por indicação do IEPHA, como última tentativa de reverter os danos, que pareciam irreparáveis. E foi como se um milagre tivesse acontecido! Com habilidade ímpar, aliada a um talento excepcional para tão delicado “métier”, Santa Bárbara não tardou a recuperar as feições originais com seus traços delicados, as cores primitivas foram resgatadas e o acabamento final ficou impecável. Um trabalho de mestre!

Acredito que só captam as belezas encerradas nas verdadeiras obras de arte quem tem belezas dentro de si. Vocação, do verbo “vocare”, quer dizer “chamado”. Este é o diferencial de Débora Elisabete Ribeiro da Silva, que transitou pelos caminhos da Arte até descobrir sua missão. A música, a pintura e a dança foram fases no amadurecimento dos dons que sempre estiveram latentes em sua alma de artífice.

(*) pianista, maestrina, regente do Coral Artístico Uberabense, Pesquisadora da História da Música em Uberaba, ex-Diretora Geral da Fundação Cultural de Uberaba

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