O resultado da eleição para o governo de Minas Gerais deixou-me perplexa e apreensiva
O resultado da eleição para o governo de Minas Gerais deixou-me perplexa e apreensiva. Pela envergadura moral do candidato Antonio Augusto Anastasia e pela presença de Marcos Montes, um político uberabense na chapa do candidato, jamais acreditei numa derrota.
Ao assistir pela televisão o apoio de uma cidade inteira, como foi o caso de Araxá, que literalmente “abraçou” o seu conterrâneo, senti tristeza ao pensar no total descaso com que a população local reagiu à indicação de um uberabense para ocupar, pela primeira vez em sua história, um cargo dessa projeção.
A recorrente expressão “Uberaba, terra madrasta”, que eu jamais aceitei, veio de imediato à minha memória. Meu Deus, todas as demais cidades poderiam escolher livremente seu candidato, menos Uberaba, que deveria levantar a bandeira de total apoio ao seu conterrâneo. Foi inacreditável o pífio resultado nas urnas quando o nome de Uberaba estava em jogo. Jamais algum candidato respeitado no cenário político estadual oferecerá novamente algum cargo a um uberabense, pois ele não somará votos, e isso ficou flagrantemente explícito. Aqui não existe bairrismo.
Lembrei-me do episódio ocorrido ainda na Velha República, envolvendo as candidaturas do Marechal Hermes da Fonseca e de Ruy Barbosa, respeitado intelectual baiano, na “Campanha Civilista” de 1910, na disputa à Presidência da República.
Ruy Barbosa era “apenas” jurista, advogado, político, diplomata, escritor, filólogo, jornalista, tradutor e orador de méritos incontestáveis. Uma das mentes mais brilhantes de seu tempo, ele foi um dos organizadores da Primeira República, juntamente com Prudente de Moraes. Atuou na defesa do federalismo, do abolicionismo e na promoção dos direitos e garantias individuais. Foi o primeiro Ministro da Fazenda do regime republicano, instalado em 1889, e, posteriormente, tornou-se deputado e senador.
Com sua candidatura, defendia a presença de um civil em detrimento da eleição de um militar à frente dos destinos do país. Sem falar que Ruy inaugurou a prática moderna de realizar comícios, percorrendo exaustivamente o Brasil de ponta a ponta em busca do apoio popular. Uma inovação totalmente desconhecida até então, quando tudo era resolvido em “conchavos” da classe dominante.
Pois bem, o Marechal Hermes da Fonseca foi eleito com o dobro dos votos de Ruy Barbosa, orgulho nacional do povo brasileiro.
Agora vejo um político que de fato seguiu à risca a máxima de Publius Syrius, pensador latino da Roma antiga: “Uma boa reputação é um segundo patrimônio”. Anastasia nunca teve seu nome envolvido em falcatruas. Pelo contrário, construiu a imagem de um político atuante, que se preocupou com o equilíbrio das contas públicas e implantou ações positivas que ajudaram Minas Gerais a superar grave crise em período anterior. Este era o perfil necessário para driblarmos a pior crise dos últimos tempos em nosso Estado.
Sempre acreditei que se não posso corrigir os males do mundo, da minha reduzida condição pessoal, posso ao menos não colaborar para que minha cidade e meu Estado se tornem piores ou até mesmo ingovernáveis.
Não basta ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso também uma boa dose de discernimento para separar a realidade da utopia. O possível do impossível. A verdade da mentira. A experiência que traça rumos seguros e retos, da “boa-vontade” sem alicerces seguros em mãos inexperientes.
A vida é feita de oposições, e negar isso é negar a realidade. Quantas vezes ouvimos dizer que “toda unanimidade é burra”? Como já dizia Alain de Botton, filósofo suíço, “devemos nos preparar para que nossos desejos batam com a maior suavidade possível contra o muro inflexível da realidade”.
Desejo uma boa gestão ao futuro governador Romeu Zema, acreditando que ele tem a teimosia dos que, não sendo bastante previdentes para enxergar as dificuldades, não veem obstáculos à sua frente. Mas, sem me esquecer de lembrar-lhe que “cada ascensão na escala do poder não é um passo para a liberdade, mas para o compromisso” (Hermann Hesse).
(*) Pianista, professora, maestrina, regente do Coral Artístico Uberabense, pesquisadora da História da Música em Uberaba e ex-diretora-geral da Fundação Cultural de Uberaba