Uma nota pequena e sucinta na coluna Cá entre nós do jornalista Alexandre Pereira, do Jornal da Manhã
Uma nota pequena e sucinta na coluna “Cá entre nós” do jornalista Alexandre Pereira, do Jornal da Manhã, do dia 7 de fevereiro próximo passado, levou-me de volta ao passado, mais precisamente aos anos 80 do século passado. Uma notícia registrada no rodapé da coluna, denominada “Ti-ti-ti”, informava: “Enterrado ontem no Cemitério São João Batista o saxofonista uberabense Lumumba”.
Meu Deus! Mergulhei no túnel do tempo e revivi anos felizes de minha mocidade. Lumumba era, então, um músico carismático, alegre, brincalhão com os companheiros que o chamavam na intimidade de “Lu Chaves”. Lu, abreviatura de Lumumba, seu pseudônimo artístico, e “Chaves” porque o estavam colocando no mesmo patamar de excelência do maestro Erlon Chaves, excelente arranjador e figura de proa no programa de Flávio Cavalcanti, o dono das noites na TV brasileira naquela época. Lu era um excepcional arranjador do Grupo Prisma, ao qual ele pertencia. Esta função sempre foi reservada aos músicos que conhecem e dominam a ciência do encadeamento dos acordes, a Harmonia, um raro talento reservado a poucos músicos.
Leonídio José Antônio da Cruz, seu verdadeiro nome, dominava toda a “família” do sax: sax soprano, sax alto, sax tenor e sax barítono. Tocava também a flauta transversa.
Lumumba era um rapaz atraente, sempre com um largo sorriso iluminando seu rosto. Sabia como ninguém explorar seu tipo físico, a sua negritude, vestindo-se com roupas coloridas e vistosas, batas charmosas bem floridas com decote rente ao pescoço. Bandanas amarradas na cabeça davam o toque final à composição de seu look singular. Era estiloso mesmo e não passava despercebido. E quando empunhava seu saxofone tornava-se irresistível.
Formou-se em engenharia civil e, após a conclusão do curso em Uberaba, foi admitido na COPASA, tornando-se gerente de divisão de operação e manutenção da COPASA em Araxá, onde passou a residir e onde constituiu família.
A Banda Prisma foi a última grande banda de Uberaba no século passado e era formada pelos músicos: Andrezinho Novaes (teclados), Jorge Bertolini (guitarra), Jorginho Zaidan (contrabaixo), Leonídio Cruz, o Lumumba (sax e flauta), Marcelo Prado (cantor e baterista), Cabral Filho (guitarra), Roberto Rodrigues, o Totó (cantor) e Mara Foroni (cantora). Surgiu nos palcos uberabenses em maio de 1985. Um grande show assinalou o início da banda, realizado no salão do Jockey Club de Uberaba, sob a direção do criativo e talentoso Demilton Dib. Um início auspicioso que assinalou o primeiro passo de uma trajetória de sucesso que levou o Prisma a viajar não só pelo Triângulo Mineiro, mas também para outras cidades de Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Goiás.
Em Uberaba, a banda tocava principalmente no Jockey Club, no Chopp Center, de Ângela Gutierrez Brandão, ponto de encontro da juventude na noite uberabense, e na boate Plataforma, nas imediações do Jornal da Manhã. No Chopp Center Lumumba era uma atração à parte, pois gostava de tocar seu saxofone circulando entre as mesas, bem perto das pessoas, com total descontração.
Jorginho Zaidan relembra com saudade um momento muito significativo que vivenciaram no Chopp Center. Estava em nossa cidade o cantor Ney Matogrosso, acompanhado pelo jovem violonista Raphael Rabello, considerado um dos maiores violonistas brasileiros de todos os tempos, sobretudo em sua especialidade - o violão de 7 cordas. Ambos tinham vindo para cá pelo “Projeto Pixinguinha”, que envolvia turnês por várias cidades do interior. Nessa noite, por obra do destino, a Banda Prisma tocava seus números de jazz quando, ao término de um número, um rapaz que estava em pé, apoiado na parede, foi em direção da banda aplaudindo calorosamente. Só então reconheceram no fã desconhecido nada menos que Raphael Rabello. Um encontro que tornou aquela noite memorável.
Infelizmente, Uberaba vem somando perdas sucessivas de nossos melhores músicos da geração anterior em curto espaço de tempo. Nos últimos seis meses já nos despedimos de Andrezinho Novaes, Januário Marques de Oliveira (Janinho) e Lumumba. Três nomes de peso!
Obrigada Lu por colorir nossa juventude com a magia de seu saxofone. O que ficou ecoando da sinfonia de sua vida nada mais é que uma “cadência” interrompida, que ficará à espera de um gran finale em dia e hora a serem marcados. Até breve!
(*) Pianista, professora, maestrina, regente do Coral Artístico Uberabense, pesquisadora da História da Música em Uberaba e ex-diretora-geral da Fundação Cultural de Uberaba