Myrtis de Lourdes Vianna Bruno – uma mulher atraente, de traços harmoniosos, vaidosa, educada e..., sobretudo, amante do belo. Sempre cheia de planos e rodeada de amigas. Dividia seus afazeres domésticos de esposa e mãe com sua paixão pela arte. Sua casa era cheia de cantinhos aconchegantes onde seu toque pessoal na decoração era sentido em cada ambiente.
Há pessoas enviadas por Deus com a missão de abrir caminhos, atuando como verdadeiras desbravadoras. Myrtis foi uma dessas criaturas especiais. A área cultural de Uberaba lhe deve muito. Foi ela a idealizadora do “Instituto Musical Uberabense”, escola de música fundada em 1956 e que durante mais de meio século formou gerações de musicistas. Para concretizar esse sonho, arregimentou duas grandes mulheres: Walmira Peres Cardoso e D. Odette Carvalho de Camargos. Trechos de uma carta escrita por ela para D. Odette deixam claras suas ações em prol da criação dessa escola, colocando como condição “sine qua non” a anuência de D. Odette de assumir a direção do educandário. Foi ela também que encontrou a casa que viria a abrigar a primeira sede do Instituto Musical, na rua Alaor Prata, nº 35, ao lado de sua residência.
Dinâmica e entusiasmada, assumiu como ninguém o papel de empreendedora. Enquanto Walmira e D. Odette se lançavam ao trabalho árduo com as alunas, Myrtis se lançou pelos caminhos não menos árduos dos trâmites legais e da luta pelo reconhecimento oficial e posterior equiparação do Instituto Musical Uberabense aos Conservatórios Estaduais. Sua atuação foi de fundamental importância para o êxito dessa empreitada.
Em 1958 vamos encontrá-la às voltas com o “Núcleo Artístico Cultural da Juventude” de Uberaba, ao lado dos agitadores culturais, Iná de Souza e Reynaldo Domingos Ferreira, dentre outros. Formavam um grupo de idealistas que lutavam por um teatro que atendesse aos jovens artistas. Conseguiram a participação do município, através do prefeito Arthur de Mello Teixeira, que cedeu ao Núcleo um barracão na rua “13 de Maio”, que foi totalmente reformado para se adequar às novas funções. Myrtis Bruno assumiu o cargo de primeira secretária do quadro administrativo e, numa entrevista aos jornais locais, falando sobre a importância dessa conquista para a juventude, assim se expressou: “Deus se aproxima de nós através da arte”.
No entanto, seus dotes artísticos iam além da música. Desde jovem se interessou pelo artesanato. Habilidosa e com senso estético incomum, foi ampliando suas ações no domínio das delicadas peças artesanais que ela criava com materiais nativos em nossa região e típicos do cerrad tocos de madeira, galhos retorcidos, folhagens que seriam desidratadas, palhas, sementes, raízes, cipós e cordas que seriam transformados em objetos artísticos. Suas mãos utilizavam os pigmentos com a sabedoria dos artistas natos, autodidatas. Seguia à risca o pensamento do poeta Manoel de Barros: “Deus dá a forma... o artista desforma...”
Com o passar dos anos, seu lado artesã falou mais alto e ela foi, aos poucos, se afastando da música e mergulhando de cabeça no artesanato. Mais uma vez tornou-se pioneira ligando-se a um grupo de idealistas que fundou a “Casa do Artesão”, onde foi atuante como artista associada e também pertencendo ao quadro administrativo da entidade. Até o fim de sua vida esteve ao lado de suas companheiras artesãs, lutando por seus interesses.
Myrtis Bruno representa a figura polivalente do artista multifacetado. Suas criações colocaram-na no patamar das mais refinadas e talentosas artesãs que Uberaba possuiu. Deixou traços de sua presença por onde passou, lançando sementes que germinaram e frutificaram em prol de nossa cidade. Saudades, minha querida amiga!
Olga Maria Frange de Oliveira
Pianista, professora, maestrina, regente do Coral Artístico Uberabense, pesquisadora da História da Música em Uberaba, ex-diretora geral da Fundação Cultural de Uberaba