Vivemos uma fase de intensa humanização dos animais. Aonde isso vai nos levar? Vou contar o caso de um conhecido meu que sempre teve animais de estimação. Hoje em dia, o pessoal chama de “pet”. Ele já teve cachorro, gato, coelho, porquinho-da-índia e iguana, mas as experiências não foram boas. Por ignorância própria, ele mesmo confessa, nunca compreendeu as necessidades dos bichos, e se desentenderam. Como resultado do desentendimento, vem o fim da relação, geralmente traumático.
São várias as dificuldades. Pensam que é fácil cuidar de bichinhos de estimação, de alguém que se diz da família? Veterinários, alimentação e companhia transformam-se em dramas cotidianos. Por gostar de viajar, sua luta é decidir se leva os bichos consigo ou se os deixa com alguém. Um problemão. Mas os dilemas não param por aqui.
Que hotel aceitaria um gato que mia a noite toda? Seriam ambos expulsos na hora. Que restaurantes se sujeitariam a receber como comensal uma iguana, acomodada numa cadeirinha para crianças? E, embora não existam placas, que eu saiba, os cinemas também não aceitam pets. Imagine se você pudesse levar seu porquinho-da-índia para ver um filme de aventuras do Indiana Jones ou do 007. Ainda por cima, comprar pipoca para o coitadinho. Ele pagaria ingresso? Meia-entrada ou inteira? E se o simpático bichinho começasse a gritar de medo? Murmurar ou grunhir? E se ele quisesse ir ao banheiro? Ah, malditas convenções!
Os parentes relutam em convidá-lo para festinhas de aniversário, jantares de comemoração, entre outras festividades familiares, comes e bebes. E se o coelho escapa na hora dos parabéns? Onde já se viu! Sempre fica de fora das confraternizações o meu conhecido.
Aí, resolveu adotar uma formiga. Ia com ela para todo lugar: na escola, no cinema, nos bares, sem constrangimentos. Ficava guardada numa caixinha de fósforos, decorada com esmero. Revestimento interno, bebedouro adequado, etc. — uma graça. Nos bares, ele escolhia uma mesa mais afastada, sentava-se, abria metade da caixinha e colocava uns grãozinhos de açúcar lá dentro. Quando não tinha ninguém por perto, a conversa corria solta. Falavam do tempo, do preço das coisas, da política.
Seu desencanto e desespero começou quando, um dia, ele a perdeu de vista. Sumiu, simplesmente escafedeu-se, desapareceu. Colocou avisos em postes, contratou anúncios nos jornais, passou a frequentar reuniões de defensores da causa animal. Mas não davam muita bola pra ele: “Formiga? Bah! Vai caçar sua turma!”.
Perdia o sono ao imaginar que alguém pudesse ter pisado nela, que ela tivesse virado comida de uma aranha ou de um pássaro. Sua maior tristeza era ser desprezado, a falta de credibilidade. Achavam que ele estava de gozação, abusando de ironias, debochando dos problemas do mundo. Nunca mais a encontrou. Se eu conto essa história numa roda de amigos, ninguém me leva a sério, acreditam? Não é o caso de vocês, caros leitores, né?