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A solidão

Renato Muniz Barretto de Carvalho
Publicado em 18/06/2024 às 18:18
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Ando preocupado com a solidão, a minha e a dos demais. Claro, tem uns e outros que são rabugentos, detestam relacionamentos, não cumprimentam os vizinhos, não ligam de ficar sozinhos – não é o meu caso. Convivência é algo social, político, cultural, não se regula por decreto, por mágica, nem cai do céu. Convivência se constrói no dia a dia, em encontros no elevador, nas lojas, nos ônibus, nas escolas, nas repartições públicas, no trabalho. Mas anda difícil.

No passado, quem morava em prédios residenciais deve se lembrar de como era bom conversar com o porteiro sobre futebol, sobre os vizinhos, sobre a vida… Aos poucos, os porteiros foram eliminados. Quando muito, restou um faxineiro, a não ser nos prédios muito chiques, mas aí os moradores saem de carro, nem observam o rosto dos porteiros, geralmente escondidos em guaritas fortificadas. Nas casas, os muros e grades predominam.

Os mercadinhos antigos, onde ainda se podia comprar fiado e anotar despesas em cadernetas, estão em extinção. Lá, se o camarada não tivesse dinheiro, levava assim mesmo. Sempre era possível provar uma azeitona pescada no vidro de boca larga, fazer considerações sobre o tempo, observar o movimento das nuvens e comentar despreocupadamente: “será que vai chover hoje?”. Até os mais tímidos eram capazes de esboçar um sorriso e de responder a um aceno. Hoje, nos supermercados, no máximo se pode cumprimentar a pessoa no caixa, e rápido, que é pra não atrapalhar a fila que se formou atrás. Nesses casos, melhor não conversar com ninguém, vai que a pessoa pensa o oposto em termos políticos; vai que uma palavra mal colocada ofende o sujeito, incomoda a mocinha envolvida com o celular, atrapalha o estudante preocupado com suas notas… Melhor não!

Os carteiros estão minguando, assim como as cartas. Daqui a pouco, vão eliminar os frentistas, como já fizeram com os cobradores nos ônibus. A palavra da vez é “terceirização”. Só não nos contam que estão substituindo pessoas por máquinas. Outro dia, tentei ligar para o telefone de uma grande empresa e me dei mal. Quem atendeu foi uma máquina e ela falou comigo como se fosse gente, pediu-me para digitar opções no teclado infinitas vezes até resolver o problema. Quase desisti.

Eu observo os carros que param no sinal. Muitos estão com os vidros levantados. Outros, mais distraídos, à menor aproximação de um pedinte, tratam de subir rapidamente os vidros, fingem que não são responsáveis pela miséria da pessoa ali do lado. Está esquisito.

É cada vez mais comum a presença de poucos moradores nas residências: dois, no máximo três por habitação. Quando chegam à noite em suas casas, as pessoas ligam a TV, continuam grudados no celular, esquecem-se de que a vida é formada por encontros. Talvez seja uma estratégia de eliminação do convívio social. Será? Não caiam nesse golpe!

 Renato Muniz Barretto de Carvalho

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