Galos não costumam saudar as noites, eles cantam para o amanhecer. É assim que funciona o seu relógio biológico. Sabe-se lá! Outros seres cantam à noite: os notívagos, os boêmios, os que gostam de serenatas, os curiangos, os bacuraus e as corujas. Afinal, é à noite que a onça e outros animais vão beber água. Nunca te contaram?
Se não estou enganado, muitas pessoas nas grandes cidades dormem cada vez mais tarde. E acordam quase na hora do almoço, se é que se pode determinar uma hora de almoço fixa, com hora marcada para saciar a fome. Quando eu costumava frequentar o meio rural, conheci pessoas que almoçavam por volta de oito horas da manhã. Nas cidades, muitos se levantam nesse horário. Questionados pela minha ignorância adolescente, o pessoal da roça respondia que acordava antes das quatro da manhã para ordenhar as vacas leiteiras, para tratar dos porcos ou molhar a horta. Mas os galos, mesmo os das cidades, continuam saudando o dia de madrugada, e me parece que cada vez mais cedo. Tem um galo vizinho do prédio onde moro que insiste em cantar por volta de três da manhã. Tenha paciência!
O anoitecer tem seus ritmos, seus prazos e seus sons. Sem falar das cores. Ah, como são lindas as cores ao entardecer. Se fizéssemos um ranking das fotografias mais comuns, certamente fotos da Lua cheia e do pôr do sol ganhariam disparado. A luz se modifica, fica mais suave, o horizonte se confunde com o céu. Ao final da tarde, é preciso recolher as roupas do varal, a umidade aumenta, a luz diminui, a tarde esfria e dá vontade de voltar pra casa. Muitos enfrentarão o trânsito caótico nas grandes avenidas, suportarão congestionamentos monstruosos, acidentes, às vezes chuva forte e inundações. Reparem nos ônibus e nos trens durante o retorno do trabalho: a maioria dos passageiros está pensativa, calada, imersa nos próprios problemas. Sim, acima de tudo, estão cansados, mas a chegada da noite ajudará nas reflexões necessárias sobre a vida, a realidade, o estudo, o trabalho. Para muitos, foi mais um dia de luta.
Sem preconceitos, e com o mesmo ímpeto, também podemos desejar boa-noite como se deseja bom dia. Não a noite das trevas sociais e políticas, como a que foi pregada pelos fascistas e pelos ditadores latino-americanos nos anos 1960-1970. Nem a noite fria dos que dormem nas ruas, mas a noite aconchegante de quem pode dormir em paz, a dos teatros, a dos bons encontros entre amigos, de música nos bares. A noite convida às reuniões em que se decidem os destinos das nações. Sejam reuniões das altas cúpulas, sejam reuniões para combinar a sublevação e a transformação social.
A noite é boa para namorar, mas também é boa para ler, desde que você tenha um abajur adequado e um bom livro para te fazer companhia.