A reivindicação era relevante, mas a complexidade do problema, guardadas as devidas proporções, também era. O fato é que ninguém podia ficar de fora. Deve-se considerar que eram meninos na faixa dos dez a doze anos. Meninos passando as férias de verão na fazenda do avô. Eles reclamavam porque queriam andar a cavalo e o avô destinou a eles apenas dois animais para passear nos arredores do quintal da sede. Mas eles eram três, a conta não fechava. Dois deles teriam de ir juntos, no mesmo cavalo, ou alguém ficaria para trás.
Entabularam cálculos e experimentaram arranjos de modo a contemplar a todos. A negociação não foi fácil. Exigências, trocas e promessas, mas, finalmente, chegaram a um acordo: na ida, o irmão mais novo dividiria o mesmo cavalo com o irmão do meio, na garupa, trocando de posição na volta. O outro neto iria sozinho no cavalo preferido do avô, afinal, era o neto mais velho, se é que isso tinha qualquer relevância para os demais. Mas era isso ou nada.
No meio do caminho, entusiasmaram-se, avançaram a galope e os cavaleiros que estavam juntos no mesmo cavalo escorregaram pela lateral do arreio e caíram no chão. O susto só não foi maior porque o cavalo era tão manso que ficou olhando os dois patetas esborrachados no capim, sem entender nada. Fosse um cavalo bravo teria saído em disparada, colocando em risco a vida dos meninos. Vendo a cena, o mais velho segurou o riso para não estimular reparações nem ressentimentos. A decepção foi maior quando, não conseguindo montar de volta no cavalo, os dois mais novos tiveram de retornar a pé, puxando o animal pela rédea. Que humilhação!
No outro dia, mudaram o arranjo. O irmão mais novo iria na garupa do mais velho e o do meio seguiria sozinho. Este, orgulhoso da posição conquistada, sentia-se o próprio dono da tropa.
Como da vez anterior, a certa altura do trajeto, entusiasmaram-se e apressaram a marcha – pois cavalos velhos costumam adiantar o passo quando se aproximam do curral –, os três acharam gostoso que os animais tenham acelerado o trote. Só não contavam com um imprevisto: um galho de mangueira bem no meio do caminho. O irmão do meio, que estava à frente do grupo, viu e agachou-se, desviou-se do galho a tempo e passou. O mais velho também percebeu o obstáculo e fez o mesmo, mas o mais novo, o da garupa, até por conta do tamanho, não viu o galho, que o apanhou bem na altura do peito, jogando-o no chão. Não teve choro, só cara feia, mas ele exigiu que todos voltassem a pé, em solidariedade, puxando os animais. Se cavalos rissem, aqueles estariam dando gargalhadas.
Renato Muniz B. Carvalho