Não sou adepto de saudosismos nem gosto de paparicar o passado. Cada fato, circunstância e recordação devem ser analisados no seu devido contexto, sabendo-se que as avaliações que fazemos podem mudar à medida que o tempo avança. Isso não significa descompromisso ou relativização inconsequente, significa ter consciência de que as coisas mudam e vão continuar mudando, independentemente da nossa vontade.
Mas este não é um texto sobre a saudade, o passado ou as instabilidades da vida. Conforme indicado no título, a ideia é falar das eleições, das primeiras eleições de que participei e de outras. Antes de tudo, confesso um medo: sempre tive receio de que poderia estar votando pela última vez. Essa sensação se deve às inúmeras conjunturas políticas desfavoráveis à democracia que moldaram a história do país desde que me entendo por gente. Pensam que foi fácil passar pelos 21 anos de Ditadura Militar entre 1964 e 1985? Foi nessa época que comecei a votar, que tirei meu título de eleitor, que fiz minhas primeiras escolhas políticas. Votei, sim, mas era tenso, às vezes inútil, um ato cercado por autoritarismos e manipulações.
Votei pela primeira vez quando tinha 19 anos, em 1976. Eu já tinha o título desde 1975, mas não teve eleição nesse ano. Em 1976, ocorreram eleições municipais, realizadas no final do ano, e, cá entre nós, segundo minhas concepções à época, pouco me importava quem eram os candidatos. Em 1978, foram realizadas eleições para o Congresso Nacional. Ocorreram no dia 15 de novembro e existiam apenas dois partidos: Arena e MDB. O partido governista (Arena) levou a maioria dos votos. Minha vontade era votar nulo, como uma forma de protesto contra as artimanhas engendradas pelo governo de plantão. Não eram eleições livres, havia muita vigilância, censura, repressão política.
O título de eleitor era um documento em papel, impresso em gráfica, com um carimbo sobre a fotografia. Tinha as informações pessoais datilografadas e um monte de quadradinhos onde alguma autoridade anotava a data e assinava a cada eleição. Faço questão de votar, nunca concorri a nenhum cargo eletivo, a não ser eleição para síndico, membro de Cipa, conselho fiscal de entidades, etc. Mas, para esses pleitos, eu não necessitava de título de eleitor.
Sempre levei a sério as eleições, mesmo sabendo do caráter autoritário e repressor do regime militar. Sabíamos que era preciso lutar em várias frentes contra a Ditadura e uma delas era a participação nas eleições, ainda que tendenciosas. As regras favoreciam os políticos subservientes ao regime. Tínhamos surpresas a cada pleito. O governo da época tentava de tudo para evitar críticas e denúncias, mesmo que tivessem de prender, torturar e matar.
Eram tempos difíceis, abuso de poder econômico, coerção ideológica, muitos “santinhos” nas ruas, luta acirrada pelos horários na televisão. Não havia internet e redes sociais. Exercer os direitos políticos era uma verdadeira batalha campal. Mudou muito?