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Era só o que faltava

Renato Muniz B. Carvalho
Publicado em 10/06/2024 às 18:08
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O Brasil é um país abençoado. Tem florestas incríveis, tem montanhas, cânions, orquídeas belíssimas, biodiversidade, cachoeiras, um povo lindo e acolhedor. O que mais? Tem… Ah, tem praias, muitas praias. Tem um litoral com cerca de oito mil quilômetros de extensão, com mais de duas mil praias, cada uma mais bonita do que a outra, algumas são famosas no mundo inteiro e recebem milhares de turistas o ano todo. Praias extensas, praias escondidas, praias paradisíacas, praias de areia fina, boas para caminhar, para apreciar a paisagem. Se tem algo realmente democrático no país, além dos botecos, são as praias. Quando se juntam botecos e praias, a felicidade está completa.

Essa felicidade está com os dias contados, ameaçava esbaforido um dos tristes burocratas de plantão que frequentavam o boteco da esquina. Ele apareceu por lá com a ideia estapafúrdia de vender nossas praias. Não sei de onde tirou essa ideia mirabolante. Será que ele não tinha coisa mais importante para fazer? Por que não cuidava da própria vida e deixava nossos sonhos em paz? Sim, nosso sonho é um dia poder ir à praia, deitar na areia, curtir as ondas, levar a meninada para se divertir. Mas não, eis que surge o sujeito defendendo a privatização das praias. Sim, você leu direitinho: vender nossas praias. Um dos argumentos é a má gestão das mesmas. Como assim? Talvez ele esteja se referindo aos dias nublados, aos dias de chuva… Tá, é preciso administrar isso. Como resolver? Não dá para viajar centenas de quilômetros e encontrar chuva na praia. Acaba o passeio.

Má gestão? Talvez ele estivesse se referido à ausência de salva-vidas. Não, eles estão lá, atentos, solícitos, salvam vidas. Estaria ele se referindo à carência de quiosques e de banheiros públicos? Isso nunca foi problema para nós. Em qualquer praia, da mais badalada à mais distante, sempre há um barzinho que vende água de coco. Deve ter se referido à aparição de tubarões em algumas praias, assustando os banhistas. Será que faltou combinar com os tubarões para eles não se aproximarem da orla? Poucas conchinhas? Som alto nas barracas, muitos vendedores de bugigangas? Será que algum desses itens é suficiente para caracterizar má gestão e justificar a venda?

Desculpem a ironia, mas observem a seguir um exemplo do que ele considerava boa gestão: vendidas as praias, devia-se fazer um imenso alambrado. Depois de cercadas, limitar o acesso, construir guaritas, cobrar ingressos, rever as concessões dos quiosques, definir quais as vestes permitidas, qual o tempo de uso, as práticas esportivas autorizadas, determinar a cor dos guarda-sóis, a metragem permitida para cada família na faixa de areia, exigir licença para uso pedagógico dos castelinhos de areia, etc. As cadeiras deveriam ser alugadas na administração. Ah, não poderia mais entrar com cerveja, bolacha ou biscoito nem sorvete. Só faltava essa! Foi expulso do boteco.

 Renato Muniz B. Carvalho

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