Gritos e sussurros é o nome de um dos mais belos filmes do cineasta sueco Ingmar Bergman. O filme, de 1972, narra a história de quatro mulheres e discute as dificuldades dos relacionamentos humanos. As semelhanças com o que eu quero contar acabam aqui. Na verdade, o título da crônica nos remete às escolas de hoje. É que passo próximo a uma delas e ouço seus sons característicos, que me encantam tanto e me dão a certeza de que ali tem vida, embora isso deixe algumas pessoas apavoradas.
Eu estou próximo às janelas das salas de aulas. Ouço os gritos de uma professora brava, certamente irritada com uma turma inquieta, que não se comporta como ela gostaria. Não sou um bisbilhoteiro, nem vou entrar e dar lições a quem quer que seja, apenas gosto de ouvir os sons que vêm do prédio. Queria saber a razão de tanta bronca, mas sigo em frente.
Mais um pouco e estou junto à quadra de esportes. Os sons são completamente diferentes. Meninos jogam bola. Eu não os vejo, mas parece que estão felizes e eufóricos. Dão gritos estridentes, comemoram, reclamam, marcam um gol. Divertem-se.
Um pouco mais adiante, escuto meninas sussurrarem. Conversam animadas sobre um acontecimento qualquer, mas que as faz praticamente ignorarem o que acontece à sua volta. O que será que viram? Uma cena chocante? Um beijo na boca?
Viro a esquina e ouço uma menininha chorando. Uma pessoa mais velha lhe dirige palavras de conforto. Escuto algo com “não fique triste”. Será que tirou uma nota ruim? Brigou com a amiguinha? Perdeu algo? Está bastante sentida e a vontade que tenho é de entrar na conversa e dizer que a vida ainda há de lhe trazer muitas alegrias e que aquela tristeza vai passar. Melhor não, deixe os acontecimentos seguirem seu curso.
Passo perto de outras janelas e escuto um animado “parabéns a você”. Alguém faz aniversário. Terão levado um bolo? O aniversariante recebeu presentes? Será que é a professora? Deram a ela uma maçã? Não dão mais maçãs aos professores?
A próxima janela é a da sala dos professores. Conversas de adultos. Falam de política, tomam café com bolachas, fazem comentários sobre alunos, sobre o final do ano, sobre a vida. Os assuntos são variados, uns falam alto, empolgados, outros quase murmuram.
É preferível ouvir os sons, alegres ou tristes, que vêm do interior das escolas a não ouvir nada vindo delas. São muito mais agradáveis os gritos e os sussurros do que a falta deles, pois isso pode significar repressão, medo ou, o que é muito pior, a ausência de escolas livres, de professores e de alunos felizes.