Meu avô não era de ficar parado, esperando o mundo se mexer. Os amigos diziam que ele era elétrico, agitado, apressado. Ele não corria, no sentido que atribuímos à correria dos tempos atuais, mas também não era homem de esperar para ver o rumo que os acontecimentos tomariam — ele seguia na frente. Se estivesse vivo, provavelmente não se renderia à velocidade estonteante das transformações efêmeras, suas atitudes o levariam a tentar entender o movimento constante da vida.
Sua agitação era alimentada por uma necessidade de olhar para o futuro. Seu desejo era contribuir para a construção de uma vida melhor para as pessoas de seu tempo e para os que viriam a seguir, as próximas gerações. Ele sonhava com um mundo diferente, um país mais justo e próspero. Não era revolucionário, passava longe disso, nem um político populista ou visionário, mas sua atuação na sociedade tampouco era retrógada ou conservadora. Enquanto viveu, buscou trilhar caminhos de entendimento e progresso, para os seus e para a comunidade onde exercia suas atividades.
Ele tinha o costume de ler dois ou três jornais todos os dias. Eu me recordo que os jornais — impressos, é claro — já estavam nas casas dos assinantes bem cedo, trazidos por meninos encarregados pelos donos de jornais de fazê-los chegar aos leitores de segunda a sábado. Hoje, isso seria inaceitável, pois não se admite mais o trabalho infantil. Ainda bem! Mas meu avô só iria ler os jornais no fim do dia, após o jantar. Quanto a isso, não tinha pressa.
Os jornais traziam uma etiqueta de papel com o nome dele e seu endereço. Essas etiquetas eram datilografadas e coladas na primeira página. Fico pensando nessa logística nas circunstâncias de extrema rapidez e complexidade dos tempos atuais. Jamais teriam passado pela cabeça do meu avô coisas como código de barras, códigos QR, comércio eletrônico e coisas semelhantes. O que nos trará o futuro?
Na sua casa comercial, um armazém de secos e molhados, as mercadorias eram vendidas a granel, pesadas à vista do freguês e, às vezes, vendidas a prazo com anotações feitas em cadernetas. Lá, era possível experimentar azeitonas e ameixas secas importadas retirando-as direto dos barris onde ficavam guardadas. Não havia sacolas plásticas, ninguém se preocupava com data de validade nem com lista de ingredientes. Mas meu avô sabia que aquele era um mundo que estava ficando para trás, só não teve tempo de conhecer as determinações da nova ordem mundial, o domínio das grandes empresas multinacionais e o mercado global. Mas ele sabia que o porvir era inevitável e irrefreável.
Sua pressa não era sintoma de precipitação ou afobação, era urgência de ver o mundo mudado, a realidade transformada. Tinha pressa de ver um país diferente, industrializado, inteligente, culturalmente forte e independente, livre de autoritarismos e retrocessos. Às vezes, a pressa é inútil; às vezes, necessária.