Olho pela janela e enxergo o muro tomado pela hera que se alastra. Parece que ela não vai sair dali tão cedo. Por cima do muro, na linha do horizonte, vejo o morro coberto por árvores esparsas, telhados cerâmicos bem-comportados e o céu entardecendo. Confesso a vocês que dá nostalgia, uma sensação indefinível. Sempre confundo nostalgia com melancolia. Apago tudo logo que percebo o despropósito da ideia, deixo dissiparem-se os sentimentos de saudade.
Não é o passado que me inquieta, mas o futuro. Eu gostaria de saber o que vai acontecer amanhã. Quem não gostaria? Não quero saber o resultado da loteria nem quem vai ganhar o campeonato de futebol, isso é desprezível para quem se dedica a fazer previsões sobre coisas que ainda não existem. Quero mais!
Qual a relevância de conhecer de antemão fatos corriqueiros: se vai chover ou esfriar, se o ônibus vai atrasar ou passar na hora certa, se vai estar vazio, se vai ser possível viajar sentado. Teremos forças para aguentar o rojão estourar em nossas mãos e chutar o pau da barraca quando for a hora de dizer “não”, com toda a coragem necessária que as negativas exigem?
Dizer “sim” é fácil, basta acompanhar o movimento das águas morro abaixo e se deixar levar pela enxurrada. Difícil é dizer “não”, gritar bem alto, de forma incisiva e urgente, contra as injustiças. Complicado é nadar contra a corrente e não se submeter às idiotices que querem nos impor a todo instante. Basta um descuido, uma distração, e o passado nos prenderá em suas raízes fortes, seus ramos secos, como a planta que gruda no muro.
Pouco importa saber qual o cardápio do dia seguinte se o que interessa é que todos tenham o que comer. Sempre existirão momentos para a troca de receitas culinárias. Por que hei de querer saber qual é o fim do romance que estou lendo se o que vale é o prazer da leitura? Quero compreender os personagens, seus medos, suas angústias e como vão fazer para superar a tirania dos poderosos. O que eu desejo é conversar com quem escreveu o livro como se estivéssemos escrevendo a história juntos.
Quem tem o poder de fazer previsões sobre o futuro não tem necessidade de saber quais ações da bolsa de valores vão subir ou descer. Nem de saber se os índices vão despencar ou enriquecer mais os ricos, qual o melhor investimento, qual a aplicação financeira mais rentável. Para quem prevê o futuro, isso é desperdício de tempo. Infelizmente, tem gente que se mata para viver disso.
Mais do que acertar previsões, é importante avançar na descoberta de cura para as doenças que nos afligem, sabendo que é imprescindível lutar pela paz e a cooperação entre os povos! Não devemos esperar a hera cobrir o muro enquanto envelhecemos sem saber o que aconteceu hoje.
Renato Muniz B. Carvalho