Chega uma idade em que meninos e meninas querem autonomia, independência...
Chega uma idade em que meninos e meninas querem autonomia, independência e muita liberdade, não é? E se lançam mundo afora, de qualquer jeito, críticos e, acima de tudo, ousados. Nem sempre as coisas acontecem conforme programado, isso quando há algum tipo de planejamento. Pouco importa!
No fim dos anos 1960, meus irmãos e eu já tínhamos conquistado parte desta autonomia. Podíamos nos aventurar onde quiséssemos, desde que nos virássemos com comida, roupa limpa e o que mais dependesse de nós. As questões práticas eram resolvidas da forma menos trabalhosa possível. Não era preguiça, era construção da experiência somada a uma imensa vontade de fazer tudo e mais um pouco. Quem não é afoito na adolescência? Minha avó dizia que nós devíamos ir com calma, mais devagar, porque o mundo não ia acabar na próxima semana. Diminuíamos o ritmo? Nem pensar! Tínhamos pressa, criatividade e disposição para mudar o mundo, começando pelos arredores.
Num fim de semana qualquer, sem maiores pretensões, resolvemos que iríamos à fazenda, pescar. A pescaria era apenas uma desculpa esfarrapada, o que queríamos era mais provar que não precisávamos dos adultos do que ficar pendurados num barranco do rio, brigando com diminutos lambarizinhos. Comida providenciada, mochilas e tralha de pesca arrumadas, arranjamos quem nos levasse e fomos...
Almoçamos na casa da Dona Auristela, comida de roça, macarrão, arroz e feijão de fazer inveja a qualquer restaurante chique ao redor do mundo. Até porque, refeição assim, saudável, farta, bem temperada, não existia em lugar algum e nunca vai existir, porque aquele foi um tempo sem volta, como são todos os tempos bem vividos. Deixam saudade!
Durante a tarde, andamos sem rumo e, para encerrar o dia sem grandes complicações, decidimos que o cardápio do jantar seria sopa de pacotinho, sem grandes arrebatamentos culinários.
Findo o dia, silenciosos e de banho tomado, era hora de resolver o jantar. Como fui o primeiro a ficar pronto, minha tarefa foi colocar água para ferver no caldeirão da sopa. Resolvi terminar de ler um livro e deixei aos outros dois as orientações necessárias à complexa tarefa de despejar o conteúdo dos pacotinhos à água fervente. Em seguida, despreocupados, cada um tratou de se servir. Nada comparado ao almoço, mas com dois ingredientes bem diversos: a independência, isto é, ter preparado a própria refeição, ainda que isso significasse ter despejado um pó amarelado na água quente, e algo que seria revelado só no final, já com o fundo do caldeirão aparecendo. Foi meu irmão mais novo que notou: “sopa boa, tem até pedaços!”, o que nos estimulou a arrematar o caldo ralo. O inesperado estava ali. Num momento que ninguém notou, uma rãzinha, uma perereca, pulou no caldeirão e se deu mal, atribuindo um sabor “especial” à insossa sopa industrializada. Pois é, a vida e o fundo do caldeirão, também, costumam nos revelar surpresas, nem sempre agradáveis.