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Utensílios domésticos

Renato Muniz
Publicado em 22/04/2025 às 18:27
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Se a gente pensar bem, esse nome — “utensílio” — é curioso. Pode ser qualquer instrumento de trabalho, pode ser uma ferramenta, um aparelho, um apetrecho, uma máquina ou um dispositivo, algo que tenha utilidade. Os dicionários dizem que o termo tem origem no latim. Num tempo marcado pelas relações líquidas ou efêmeras, o digital em contraposição ao analógico, algumas ferramentas ou utensílios parecem estar ameaçados. Ou tendem a ficar esquecidos, no mínimo desprestigiados.

Vejam o que está acontecendo com os utensílios domésticos de cozinha. Colher de pau, por exemplo, condenada, sumariamente recusada nas grandes cozinhas. Se muito, vai servir agora como objeto de decoração, servirá para pendurar na parede. Seu uso não se recomenda mais. Pobre colher de pau. Desde quando existem? Desde quando servem nossas cozinhas? Quem nunca usou uma?

Uma tia paterna, que ajudava minha mãe a cuidar da gente, tinha várias, uma de cada tamanho, algumas para doces, outras para salgados. Nunca imaginei que fossem banidas das casas de família, destinadas ao lixo da cozinha ou transformadas em peças decorativas.

Além de sua coleção de colheres de pau, minha tia tinha outros utensílios de madeira, entre eles a famosa gamela de onde saíam pães de queijo, bolos e outras guloseimas e quitandas deliciosas. Tinha garfos, batedores, cuias, raspadores e sei lá mais o quê, muita coisa se perdeu. Esses utensílios, quando não estão em uso, degradam-se, mofam, ficam quebradiços. Talvez venha daí sua reprovação.

Eu não sou cozinheiro, muito menos chefe de cozinha, nem tenho pretensões, mas gosto de cozinhar quando tenho um tempinho sobrando. Gosto de fazer pão de queijo — receita dessa minha tia —, faço boas omeletes, ovos mexidos, pizzas e outras massas, e saladas criativas e nutritivas. Paro por aqui, com toda a humildade.

Mas ando confuso com tanta desinformação sobre os tais utensílios de cozinha. Isso tem me atrapalhado, desanimado. Afinal, não posso mais usar colheres de pau? Já tem jurisprudência sobre o assunto? E as tábuas de cortar legumes? Também não pode mais? Tenho de usar as de plástico? Ah, não pode. E as de silicone? De alumínio? Só falta dizerem que não se pode mais cozinhar em casa. Comida agora só ultraprocessada, enlatada, embalada, congelada…

Estou exagerando, e espero que as autoridades competentes e os pesquisadores cheguem logo num consenso e nos orientem. Talvez as colheres de pau devam vir com uma advertência: “esta colher não deve ser usada por cozinheiros com menos de 30 anos”, algo assim. Ou isto: “esta colher pode conter bactérias se não for bem higienizada”. Dizeres tais como nos maços de cigarro. O que você acha?

Sim, são tempos difíceis, porque são tempos de transição. O que virá depois não sabemos. Da minha parte, gostaria de continuar aprendendo a cozinhar sem traumas, sem receios. Espero que não nos tirem as ferramentas de trabalho, como já fizeram com tantas profissões.

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