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Vida tangente

Ricardo Motta
Publicado em 23/11/2023 às 18:30
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Cartola poeta disse que precisava andar, que sairia por aí a se procurar, e que somente voltaria quando se encontrasse. Já Milton Nascimento se diz preso a canções e paixões, que nunca têm fim, busca se encontrar longe do seu lugar, como "eu caçador de mim". Afinal, onde estamos, em nós mesmos, fora de nós? É preciso saber para refletir. Será necessário andar à procura de si mesmo, fora, ainda que lá longe do seu lugar. Enfrentar as dolorosas paixões inebriantes. Na verdade, há que se esforçar para encontrar em si, na harmonia do seu sentir, ter coragem, não fugir. Talvez careça até ser valente na busca, mas tem que se decidir. Todavia, algum dia esta procura será inevitável, porque é obrigatória. Não adianta adiar, tentar escapar. Ela permanecerá, renascerá até compreender que terá que defrontar-se. Não basta a ilusão de si, o sonhar. Conquanto, há de saber, conhecer a si importa em humildade, uma vez que todos somos celeiro de defeitos e fraquezas, tal como as que nos levam à fuga de nós mesmos, evitando decifrar nossas verdadeiras vontades, das mais rasas às mais complexas e profundas, nem sempre confessáveis. Não se pode mascarar derrotas, recusar aceitá-las, embora seja mesmo muito difícil perder. Nesta sanha de negar o que de fato está dentro de si, paralisa-se pelo orgulho, pelo ódio negado, pela inveja inconfessa, tangência da vida para evitar o próprio ser. Dolorosa a existência questionando o por que que não se tem, quando na verdade se tem exatamente o que se merece ter. Mas aceitar o reflexo verdadeiro da imagem de si faz inerte o evoluir. Narcisista não gosta da própria imagem se belo não se sentir. Fica sem face o Narciso. Dizer que odeia quem subtraiu sua prenda para não confessar que sente inveja de quem a levou e com ela ficou, ou transformar em mágoa a paixão pelo amor perdido porque não pode aceitar que ainda ama o que perdeu,  face o  orgulho não permitir a consciência da dor da perda, negar dentro de si as próprias deficiências, mascarando com desculpas vitimistas e recusando reconhecê-las, para permitir transformar-se de fato, não é caminhar à procura de si, não é ser algo no sentido de "caçador de mim". É estagnação que afeta ao morrer, não sequer caminhar ao encontro de si. Ledo engano a deserção, que estabelece íntima e constante aflição de fugir, fugir e fugir de si mesmo, sem saber onde está. Tente se encontrar para obter a paz e a consciência de si. Não se ignore. Procure-se, seja onde for, esteja onde estiver. Livre-se da agonia da angústia negada por não conhecer de si. Traduza seu eu. Deguste-se. Altere rumos para evoluir.

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