Nesta semana em que a segunda-feira abre também um novo mês, os olhos do país se voltam para o Supremo Tribunal Federal. Lá, serão julgados os acusados de participação na chamada “trama golpista”, um suposto complô, nascido da inconformidade com o resultado das últimas eleições, que teria como objetivo tomar o poder à força, ferindo as instituições democráticas.
Não é a primeira vez que o Brasil assiste a um julgamento de conspiradores. Mais de dois séculos atrás, outro episódio marcou nossa história: a “Inconfidência Mineira”, que teve como cenário as ladeiras sinuosas da antiga Vila Rica, hoje Ouro Preto. Assim como agora, um grupo foi acusado de tramar contra a ordem vigente e 34 pessoas acabaram presas preventivamente.
Naquele final do século XVIII, o plano dos inconfidentes era criar uma República Independente em Minas Gerais. Inspirados pelos ideais libertários que ecoavam da França e da América do Norte, pretendiam romper com o domínio português. Entre as ações previstas estava até a execução da autoridade local, representante do Império, conforme denunciado por Joaquim Silvério dos Reis, o “delator premiado” da época.
O estopim não foi uma disputa eleitoral, inexistente naquele tempo, mas a cobrança do imposto de 20% sobre todo o ouro extraído, obrigatoriamente entregue às casas de fundição. Era o “quinto dos infernos”.
Como muitos sonegavam, a Coroa decidiu aplicar a “derrama”, cobrança geral e implacável dos débitos acumulados, atingindo a todos sem distinção. O anúncio dessa medida foi o gatilho para que fazendeiros, poetas, militares, iluministas e até um promotor de Justiça se reunissem em segredo, aguardando o momento de deflagrar o levante. O sinal combinado para o início seria o “dia do batizado”.
O desfecho é conhecido. Após a delação, muitos foram presos, alguns sem sequer saber dos planos, e permaneceram encarcerados por cerca de três anos até o julgamento. O poeta e advogado Cláudio Manuel da Costa morreu logo após ser detido; oficialmente, suicídio, embora haja controvérsias. Ao final, alguns foram absolvidos; outros, condenados ao degredo, e onze receberam a pena de morte.
Uma carta de indulto enviada por D. Maria I salvou dez deles, mas apenas depois de o Tribunal anunciar a todos a sentença de enforcamento. O único executado foi Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, enforcado em 1792 no Largo da Lampadosa, atual praça Tiradentes, no Rio de Janeiro, tornando-se posteriormente Patrono da Pátria e Mártir da Inconfidência.
Quase três séculos depois, guardadas as diferenças históricas e institucionais, o julgamento que agora se inicia em Brasília desperta ecos daquele episódio. Nos corredores do poder há quem murmure que as sentenças já estejam traçadas e que, mais adiante, possa vir uma anistia concedida pelo Congresso Nacional, a “Rainha Maria” de nossos dias.
Resta saber se será clemência para todos ou se, como outrora, um único nome será escolhido para carregar sozinho o peso do exemplo. Estaremos prestes a criar mais um mártir?
Tharsis Bastos