Muitas situações nos dão motivo para abaixarmos a cabeça. Mas não tive motivo maior para me curvar tanto do que a perda de pessoas raras, singulares na sua humanidade, que amamos para sempre e que são parte de nós mesmos. Estive assim, curvando-me, quase tocando o chão, quando perdi a minha mãe. Agora, vejo-me novamente de joelhos em terra, em total desvalia da razão, com a partida de minha amiga-irmã da vida inteira, a Terezinha Hueb de Menezes, que me chamava amorosamente “minha irmãzinha”. Susto, lágrimas, luto, tristeza, porque o mundo fica desfalcado de quem o fazia melhor. Parcas e impotentes são as palavras para expressar o inexplicável, o irremediável. Assim ficamos face ao que é maior que nós: curvados e em silêncio, encolhidos na nossa pequenez e fragilidade terrena.
A minha amiga fraterna – companheira nas escolhas e realizações profissionais; conselheira para qualquer hora; mãe no seu sereno acolhimento ao que fosse preciso; “minha revisora oficial”, craque na solução de toda dúvida gramatical, e mais craque ainda na dimensão da sua imensa sabedoria – faz parte muito significativa da minha essência. Caminhamos em profunda sintonia e unidas por parentesco espiritual, com que a vida me presenteou. Encontro privilegiado esse que revela algo de sagrado, no entendimento de almas que sonham e criam, independentes de fatura material, apenas confiantes na beleza, contra tudo que queira se opor a ela.
Do mistério que nos invade, talvez brote a luz que faz compreender que, dentro mesmo do limite humano, se é capaz de alcançar Deus no melhor de si mesmo e do outro. Encontrei, então, um pouco dEle na personalidade nobre da Terezinha, ser luminoso, de porte delicado, terno, gentil e leve. Digo isso pela nossa convivência preciosa de quase 40 anos, feita de cumplicidade em todas as circunstâncias, de alegria e de tristeza. Compartilhei de momentos únicos da sua caminhada. Vi o crescimento da sua família e o sucesso dos filhos. Admirei-me diante da sua dedicação integral ao Colégio Nossa Senhora das Graças, e da sua capacidade de administrá-lo, mesmo não tendo mais ao lado o seu amado Murilo. Como mulher, me orgulhei do toque feminino que ela deu à Academia de Letras do Triângulo Mineiro, numa gestão guerreira e laboriosa. Testemunhei o seu amor pela palavra ao longo da vida, demonstrado na publicação infalível da crônica semanal no Jornal da Manhã e nos livros de poemas e crônicas, lançados a partir da década de 70 (o primeiro, Tempesfera, de 1979).
Ela foi presença fiel – e como foi! – em tudo o que de importante sucedeu na minha vida. Sempre chegando com passos suaves e com flores nas mãos. Como minha aluna no Curso de Letras, um pouco mais velha que eu, acatou com postura discreta e humilde a iniciante, que eu era, no magistério universitário. Foi ética como aluna, como professora (atuando comigo na Fista em Literatura Brasileira) e na condução do Centro de Ciências Humanas e Letras da Universidade de Uberaba.
Muita gente tem lindas histórias para contar sobre a Terezinha, enriquecidas pelas muitas virtudes que fizeram dela uma pessoa excepcional. Teremos que buscar inspiração e alento na poesia da sua alma, inscrita em palavras, em nós e no mundo, para nos reerguermos do chão.
(*) Educadora, doutora em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa