Governo Municipal pondera ser uma "decisão dificílima", mas necessária para resolver um problema de décadas
Atendimento no Hospital da Criança (Foto/JC Duran)
A decisão, antes tida como consensual, de intervenção administrativa no Hospital da Criança pela Prefeitura de Uberaba foi rejeitada pelo corpo técnico e pela diretoria da unidade em assembleia realizada na noite desta quarta-feira (19). No entanto, o Governo Municipal mantém a posição e garante que há respaldo para seguir sem a aprovação do HC.
Em entrevista à Rádio JM, nesta quinta-feira (20), a presidente do Hospital da Criança, Maria Aparecida Magnabosco, rebateu a informação da prefeita Elisa Araújo de que não seria feita uma imposição da decisão. Presente na reunião que definiu a intervenção, no começo do mês de abril, a presidente do HC afirmou que não concordou com a deliberação e que deveria ser realizada uma reunião com todos os agentes da unidade. Desta forma, foi realizada uma assembleia, nesta quarta, para definir o posicionamento oficial do hospital, mesmo após a participação na apresentação do diagnóstico feito pela Sociedade Educacional Uberabense.
“Eu sempre disse na prefeitura que deveria fazer uma assembleia geral no hospital, com todos os agentes, corpo clínico, diretoria, e o conselho, que rege o estatuto. A presidente tem que acatar o estatuto. Sem ele, não fazemos nada. O estatuto manda uma reunião para ouvir a opinião dessas pessoas, todos os médicos do hospital, o pessoal da minha diretoria (...) E não concordamos. Foi unânime, o corpo clínico não quer, a diretoria não quer. Eu não poderia carregar o peso nas costas, por isso fiz a reunião. ‘Ah, a Cida entregou o hospital’, não, estávamos todos juntos”, declarou a presidente.
Na visão de Maria Aparecida Magnabosco, o maior gargalo seria o repasse financeiro, que está abaixo do necessário para atender a demanda crescente da unidade. “Fui buscar que ela [a prefeita Elisa] nos ajudasse mais, porque temos dificuldade financeira. Houve a pandemia, tudo aumentou, o número de pacientes… Antes atendíamos 80 pacientes e hoje são 250, por dia. Na época do ex-prefeito Paulo Piau, ele fez um acordo com uma verba mensal para o hospital atender todas as crianças de Uberaba. Era repassado na época o valor, que considero hoje irrisório, de R$ 140 mil. Há dois anos, o hospital não tinha esse número de pacientes, a cidade dobrou de crianças. Coube a nossa prefeita aumentar esse repasse de R$ 280 mil, R$ 300 mil. É remédio, tratamento médico. Você acha que dá esse dinheiro para atender uma UPA de Uberaba? (...) Nós desejamos da prefeitura que aumente a verba para as crianças que estão lá, porque, se não, não temos condição de atender uma UPA (...) Não estamos pedindo mais do que a justiça”, ponderou.
No entanto, questionada, ela admitiu que a unidade não tem sistema atualizado de prestação de contas ou mesmo anotações de serviços. Tudo é feito manualmente, inclusive a contabilização de recursos e o déficit mensal, que não foi apresentado na entrevista. “O sistema do hospital não está digitalizado, trabalhamos com papel. Sem um meio de digitação fica complicado, mas, mais ou menos, há uma dívida real de R$ 800 mil”, diz.
Esse é o principal ponto de conflito na decisão de intervenção. A Prefeitura de Uberaba entende que há um problema grave de gestão, que se arrasta há décadas e precisa ser resolvido, mesmo que seja uma medida “brusca”. Também em entrevista à Rádio JM nesta quinta, o secretário de Comunicação Marcos Ferreira afirmou que o Governo Municipal ainda não recebeu oficialmente o posicionamento da diretoria do HC, mas mantém a decisão de intervenção e tem respaldo para seguir com as tratativas.
“Sabemos que, para ter a intervenção, não precisa da decisão do conselho, e todas as medidas são tomadas consultando o Ministério Público, dentro da legalidade. Agora, tem que reforçar o motivo principal dessa intervenção, por que a prefeita resolveu fazer isso? Para resolver o problema que existe ali há mais de 20 anos. (...) E claramente sabemos que o problema está na gestão, e hoje a prefeitura não tem domínio sobre essa gestão. Não é só ‘hoje eu passo R$ 100 mil, R$ 300 mil, e vou passar R$ 1 milhão’, isso não vai resolver. A presidente não tem o valor do déficit na ponta da língua, como tem gestão se não tem o déficit? A prefeita não quer fazer politicagem, é assunto sério, ela é mãe, é para resolver. Ela tem ciência que, a partir da intervenção, a responsabilidade será da prefeitura, então a gente toma essa decisão, que é dificílima, para resolver”, avaliou o secretário.
Marcos relembrou que os representantes do Hospital da Criança, incluindo a presidente Maria Aparecida Magnabosco, estiveram na reunião de decisão da intervenção e havia sido uma deliberação consensual. “Não seria ‘por goela abaixo’ porque, na reunião, havia sido consensual [a decisão]”, diz. Ele acredita que há interferência política em uma mudança de postura da direção da unidade, uma mudança clara de posicionamento para desgastar a prefeita Elisa Araújo.
Questionado sobre a possibilidade de retomar tratativas sem a necessidade de intervenção, Marcos Ferreira foi taxativo e reforçou que a Prefeitura manterá a definição. “Não há tempo para sentar e ficar conversando. Há quanto tempo que existe esse hospital, esses problemas? Temos que ter uma mudança radical para acabar com o problema. Esse é o foco da prefeita. A questão é mais do que recurso. São métodos de gestão. Não falamos que a prefeitura assumir é só colocar dinheiro, é gestão, revisão de quadros de pessoal, análises de processos. Não é só dinheiro, a preocupação não é só essa”, avaliou.