CAMINHOS DA MENTE

Quais propostas dos prefeitáveis são interessantes a Uberaba para a saúde mental?

Sérgio Marçal
Sérgio Marçal
@sergiomarcal.psicologo
Publicado em 25/10/2024 às 07:51Atualizado em 25/10/2024 às 08:27
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Reverberando criticamente as propostas dos candidatos a Prefeito para a Saúde Mental 

  • Propostas da candidata Elisa Araújo

Leitos de saúde mental para crianças e adolescentes

Esta é sem dúvidas uma das grandes lacunas da Política de Saúde Mental a nível nacional, e por óbvio, municipal, representando desse modo um avanço importante e sensibilidade. Todavia, cabe pontuação de que leitos hospitalares constituem Atenção Terciária/Hospitalar, ou Alta Complexidade. Observando o princípio organizativo do SUS da hierarquização do cuidado, estabelecido pela Lei Nº 8080 de 1990, é essencial destacar que a assistência em saúde mental também no caso da infância deve estar acessível desde a Atenção Básica ou Primária, de modo a se fazer a prevenção e promoção em saúde mental, evitando adoecimentos e seus agravos. A saúde mental não pode estar dissociada dos cuidados em saúde como um todo. Para casos de adoecimento instalado, ainda não graves que seriam papel do CAPSiJ, Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil, clama atenção, um Ambulatório de Saúde Mental voltado exclusivamente para crianças e adolescentes, atualmente inexistente, visando evitar o agravo dos casos, para que estes não cheguem ao CAPSiJ, tampouco a leitos hospitalares, que são o topo da complexidade assistencial em saúde, cujo uso sinaliza insucesso do cuidado. Trata-se de cumprir a lógica de prevenção e cuidado na Atenção Primária e Secundária, evitando-se o Hospital, para o qual o resultado do cuidado tende a ser mais incerto e muito mais caro financeiramente ao Sistema.

Prevenção e combate às drogas entre crianças e adolescentes

Proposta muito urgente, inclusive por incluir a educação e comunidades em sua concepção. Cabe destacar que uso de drogas e adoecimento mental não são um fim em si, mas consequências de vulnerabilidades não trabalhadas no tempo devido e ao longo do desenvolvimento individual, bem como produto de direitos não acessados em sua integralidade. Reforço importante nesse sentido, seria estruturar um Programa com diretrizes, indicadores e metas ampliados intersetorialmente para outras Políticas Públicas como Assistência Social, por meio dos CRAS, Centros de Referência em Assistência Social, nos territórios vulneráveis, bem como na rotina de prevenção de grupos das Unidades Básicas de Saúde, UBS, uma vez que a saúde mental não é um campo fora da saúde, tampouco exclusivo de serviços especializados para pacientes graves.

Saúde Mental na Atenção Básica e Psicoterapia

Igualmente importante e urgente é a proposta de ampliar do acesso ao acompanhamento em saúde mental nas Unidades Básicas de Saúde, UBS, enquanto porta de entrada para o sistema de saúde, garantindo que a população receba acompanhamento contínuo, com psicólogos. Há todavia, que se destacar que o cuidado em saúde mental não se restringe exclusivamente aos psicólogos, uma vez que todo cuidado que produz sensação de bem estar, produz saúde mental. Conforme dissemos, todos os profissionais de saúde têm limite de competências a serem desempenhadas na diminuição de vulnerabilidades que produzem sofrimento e adoecimento mental, desde médicos, enfermeiros, assistentes sociais até os agentes comunitários de saúde, figuras estas de extrema importância e pouco reconhecidas.

CAPS III para pacientes graves

Qualificar o CAPS Dr. Inácio Ferreira em CAPS III para melhorar a estrutura do tratamento de casos graves, permitindo funcionamento 24 horas por dia. Proposta importante, uma vez que pacientes já assistidos pelo CAPS, que por ventura entrem em crise em período noturno ou finais de semana atualmente se dirigem às UPAs, que desconhecem seu histórico de saúde mental, contribuindo para que o cuidado não seja o ideal. Possibilitar acolhimento integral com equipe que conhece o caso do paciente, com certeza constitui-se em avanço importante, evitando inclusive internações hospitalares psiquiátricas.

Parcerias e alta complexidade

O olhar de fortalecimento dos serviços públicos de saúde mental, melhoria das condições de cuidado e alcance de instituições parceiras, assegurando que a população tenha acesso a um atendimento de qualidade, contínuo e humanizado é proposta que pode permitir ampliação de assistência com agilidade, eficiência e adequado controle, a depender da qualidade dos contratos e efetiva fiscalização e monitoramento dos mesmos. Situação do tipo ocorre por meio da parceria entre a Prefeitura e a UNIUBE, gestora do Instituto Maria Modesto, IMM, anteriormente conhecido como Sanatório Espírita, referência em tratamentos psiquiátricos na região através da oferta de consultas ambulatoriais em psiquiatria, nó crítico da rede de saúde, além de internação integral para pacientes psiquiátricos com indicação de hospitalização. Deve-se destacar que essas parcerias são aplicáveis a serviços de saúde de quaisquer natureza ou especialidade, e complexidade

  • Propostas do candidato Tony Carlos

Prevenção

Fortalecer ações de saúde com programas para reduzir fatores de risco associados ao sedentarismo, obesidade, tabagismo e uso de álcool e outras drogas é proposta importante que deve consistir no cerne do trabalho da Atenção Básica nas UBS enquanto rotina de trabalho. Para tanto, a gestão, desde o nível central à ponta da assistência nas unidades de saúde precisa conhecer a Política Nacional da Atenção Básica enquanto conjunto de ações de saúde, de âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde.

Fortalecimento de serviços

Fortalecer os serviços de saúde mental com o aumento do número de profissionais e recursos para tratamento e acompanhamento, e expandir e requalificar os Centros de Atenção Psicossocial, CAPS, incluindo o fortalecimento do CAPS Álcool e outras Drogas, CAPS AD. Trata-se de proposição importante, observando a sobrecarga instalada de pacientes graves sobre os CAPS em razão do adoecimento cada vez mais precoce e grave da sociedade como um todo, inclusive diante da desassistência histórica na área. É essencial destacar além de recursos humanos, a necessidade de transformações estruturais nos CAPS de modo amplo, diante do aumento de demanda e provimento de recursos materiais para oficinas terapêuticas, de reabilitação e geração de renda. Além dos CAPS, que ofertam cuidado ao paciente grave, as demais complexidades carecem de reestruturação e fortalecimento a exemplo da prevenção na Atenção Básica, ampliação de atendimento nos Ambulatórios com filas de espera, e urgência e emergência.

População atípica, autistas

A proposta de fortalecer as linhas de cuidado para pessoas com Transtornos do Espectro Autista, TEA, e outras deficiências físicas e intelectuais, com ações intersetoriais, somada à melhoria da acessibilidade em serviços de saúde e educação para esses grupos é medida importantíssima e urgente. A fila de neuropediatria no segmento se multiplica em progressão geométrica, as escolas encontram-se sobrecarregadas com a explosão de casos e falta de integração assistencial com as demais políticas, e outras ações como socialização, esporte, lazer e cultura são insipientes ou quase inexistentes.

Atenção domiciliar para grupos específicos

Expandir os serviços de assistência domiciliar para idosos, pacientes crônicos e pessoas com mobilidade reduzida é proposta igualmente importante, uma vez que estas populações muitas vezes são negligenciadas em seu direito básico de acesso ao cuidado em função de limitações físicas secundárias à doença de base, assim como na integralidade do cuidado requerido que na maioria das vezes não se limita a uma única categoria profissional ou especialidade. Cabe destacar por outro lado que prevenir a instalação destas condições por meio por exemplo do aumento da cobertura da Atenção Básica e atendimento especializado no tempo devido é essencial.

  • Nossas palavras finais

Doença não é fenômeno instantâneo

Nenhum adoecimento é um fim em si, ou seja, não se instala de um dia para o outro. A doença é produto de construções socioculturais complexas, que vão desde a desinformação e ausência de educação em relação à própria saúde e recursos disponíveis para cuidado, passando pela falta de acesso e cuidado no tempo devido. O descompasso entre as necessidades de saúde da população e o avanço e gestão dos serviços é outro fator a ser considerado. Não é possível a existência de bairros sem referência de prevenção e promoção de saúde, as Unidades Básicas de Saúde no caso. Além desse passo inicial, o acesso a suporte diagnóstico e terapêutico, a exemplo de exames e acesso a especialidades é outro ponto crítico que colabora para agravamento de quadros de saúde, piora nas perspectivas futuras, e maiores gastos com hospitalizações e reabilitações que poderiam ser evitadas se o cuidado fosse ofertado no tempo devido.

O SUS não pode ser para-choque da sociedade

Outra questão estrutural a ser trabalhada na relação entre as políticas públicas que muito carece de crescimento é o fato de que, enquanto for atribuído ao SUS o papel de amortecimento das mazelas sociais, ele seguirá sobrecarregado e estigmatizado de ineficiente. O que significa isso? A mudança necessária para se ter saúde, qualidade de vida e exercer cidadania de fato para além de sobreviver consiste em mudança estrutural na concepção da prestação de serviços públicos de modo amplo, ou seja, não cabe ao SUS apenas, pois se este estabiliza o paciente, mas as condições sociais que o fizeram adoecer não forem trabalhadas pelas demais políticas como assistência social, empregabilidade e renda, habitação, educação, o cidadão retorna para todas as vulnerabilidades que motivaram o adoecimento e sofrimento, e perde-se todo o processo de cuidado. Por isso, “Você tem fome de que? Você tem sede de que?

Gestão do servidor Público e cuidado de quem cuida

Os candidatos não mencionaram em suas propostas, o cuidado da saúde mental dos servidores públicos. Exige atenção o fato de adoecimentos mentais serem a segunda maior causa de afastamento do trabalho no país atualmente. Ações de prevenção e cuidado da saúde mental do trabalhador efetivas, ininterruptas e longitudinais são essenciais à qualidade do serviço prestado e dignidade do trabalhador. O cuidado de categorias específicas que notadamente apresentam maiores índices de adoecimento como trabalhadores da saúde, professores e segurança pública é urgente.

Vote com consciência e não seja cidadão apenas no período eleitoral

Lembre-se de que o processo político não termina com a apuração das eleições no domingo. Você precisa buscar conhecimento sobre seus direitos, exercer a democracia para além de eleições participando dos espaços comunitários, propondo alternativas e buscando estas junto do poder público, que é prestador de serviços e não apenas poder. Só é possível conquistar aquilo que se conhece, por isso, aproprie-se daquilo que deve ser seu e nosso, e busquemos isso.

Não se esqueça que cuidar e ser cuidado, amar e ser amado são formas de existir e se por no mundo.

 Mesmo que nada seja eterno, tudo o que cuidamos dura mais. (Autor desconhecido)

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