A maldição das drogas Repercutiu internacionalmente artigo escrito pelo ex-presidente FHC, comentando o fracasso das políticas de combate às drogas, e não apenas no Brasil. Falou o óbvio. Não é preciso ser especialista no assunto para atestar isso. A realidade das ruas, vivida pelo lado de dentro, como agente ou vítima ou simples expectador, é prova provada que os governantes e as autoridades de segurança pública fracassaram.E, na esteira, incapaz de se opor o fascínio e a sedução que o mundo externo exerce sobre os jovens, a família também está fracassando. Teses e mais teses têm sido escritas sobre o tema (as drogas, por que usá-las e suas consequências), simpósios, seminários, congressos, encontros e reuniões atraem especialistas, diretamente interessados, leigos e curiosos. Mas os desafios persistem. Ninguém tem a receita certa, na dose exata, racional, contra esse mal que se se alastra e cria raízes numa sociedade que, no geral, faz de conta que ele só existe na família dos outros. A omissão é generalizada. Vai do simples cidadão que mora ao lado da “boca de drogas”, passa pela família e chega às autoridades, muitas delas de discursos bonitos, inflamados, de levar às lágrimas, mas que, em verdade, nada fazem. São apenas discursos. Muitas dessas autoridades, dizendo-se preocupadas (e não passam disso), preferem até mesmo jogar a culpa na família. É fácil, pois a família que entende ter falhado, sejam quais forem os fatores, veste a carapuça e se silencia; aquela que julga o problema distante de si, não se sente alvo da crítica. Indiscutível que a família tem falhado. E os motivos são inúmeros: falta de atenção para com o dia-a-dia do filho, da criança à adolescência, falta de tempo por precisar botar comida em casa e enquanto trabalha os filhos ficam sozinhos, falta de conhecimentos sobre o assunto, confiança excessiva. Enfim, ao pé da letra, sempre há falha quando as coisas não acontecem como o desejad por criar as condições para si, por não interpretá-las adequadamente, por não saber enfrentar os desvios de percurso, por não encontrar amparo no sistema e até mesmo por omissão. Mas, não é apenas a família, instituição enfraquecida também pela omissão das autoridades, em todos os níveis, que falha. Das autoridades políticas às policiais, passando pelas religiosas, a maioria tem sua parcela de responsabilidade. Ou simplesmente falhou. Todas se dizem preocupadas, mas poucas procuram contribuir efetivamente para a contenção dessa represa rompida há pelo menos duas décadas e da qual vaza um mal que não diminui nem parece ter fim. Só aumenta. Já se ouviu até que não é o traficante quem desgraça a família. A desgraça da família é o seu dependente. Em parte, verdadeiro. Não por inteiro. O usuário de droga, em sua maioria, é um doente, assim já reconhecido pela Organização Mundial de Saúde. E não é pelo fato de o paciente ser canceroso que o médico tem o direito de lhe tirar a vida ou se prescrever veneno ao invés de remédio. Quem comercializa drogas está vendendo a morte. Não tem nada de inocente. Faz da desgraça alheia o seu meio de vida. Muitos desses comerciantes vivem como “pessoas honradas” da sociedade, frequentando os melhores ambientes e convivendo com quem deveria combatê-los. As consequências das drogas têm sido discutidas muito mais por iniciativas populares do que pelo sistema, embora este saiba, e cita números frequentemente, de que a violência instalada no País vem direta ou indiretamente das drogas. Quantas vezes já ouvimos que 80% dos delitos têm alguma relação com elas (maconha, cocaína, crack etc?). Muito bem. E quanto tempo se perde por dia, por semana ou por mês discutindo-se estratégias contra as drogas? Formas de combatê-las com eficiência? Formas de se colocar as mãos nos milionários de fortunas suspeitas tratadas como se fossem vendedores de rosas? E quais são as iniciativas voltadas para os dependentes? Para chamá-lo às suas responsabilidades? Vivemos um faz-de-conta quando se trata de políticas de combate ao tráfico e de assistência ao dependente, que, ao invés de ser encaminhado a tratamento ao ser pego pela primeira vez, simplesmente assina um “termo de compromisso” de que não voltará a usar drogas. É cômico, pra não dizer patético. O sistema faz de conta que fez a sua parte e vamos todos dormir de “consciência tranquila”, mesmo sabendo que nada foi resolvido. Nem a mãe que acompanha o filho a essas audiências, esperançosa de que ele “passe um susto” (e até mesmo rezando para que isso aconteça), acredita à saída que aquilo vai dar resultado. É um filme que conhece com outros atores. O que ela sabe é que o filho continuará lhe roubando tudo em casa, até mesmo o pacote de arroz da semana, para trocar por drogas. E isso não é ficção. Uma outra demonstração de que o sistema bate cabeças e age como barata tonta na busca de eficiência nas ações contra as drogas é a enorme quantidade de projetos de lei versando sobre o tema em tramitação no Congresso. São propostas de especialistas, estudiosos do assunto, simples curiosos, palpiteiros. Tem de tudo um pouco. Gasta-se enorme soma de dinheiro para discuti-las, colocá-las em execução, se aprovadas, e na maioria das vezes para nada. Passando atestado de incapacidade de combater o mal, algumas autoridades até sugerem a liberação do uso de drogas. O que se pretende com isso? Quais seriam os resultados positivos da medida? Não é andar na contramão, quando os especialistas são unânimes em apontar os males que elas causam à saúde? Os questionamentos são vários e as vozes em discordância também, incluídas outras igualmente autoridades e também especialistas. E, na falta de um consenso, vamos dando cabeçadas e enxugando gelo (expressão muito usada pela Polícia Militar, e com razão, para exemplificar suas dificuldades no combate ao crime num País em que expressiva parcela de conhecidos criminosos permanece nas ruas infernizando a vida das pessoas). Eu também não tenho a receita. Mas, sei que muitos ainda se arrependerão amargamente por nada ter feito. E sei também que as drogas ainda farão milhares de novos infelizes em Uberaba e darão muito trabalho à sociedade, às famílias, às polícias e ao Judiciário. “As dificuldades não esmagam um homem, fazem-no.” (Arthur Meighen)