Quem já achou chique usar maconha, tentando consolar pais preocupados com os filhos que iniciavam o próprio calvário ("eu também já fumei, isso é coisa de jovem, passa"), narrando suas experiências na juventude, hoje grita por socorro, em desespero.
As mesmas vozes que antes queriam a descriminalização da droga – para facilitar o consumo e ajudaram a criar um novo e próspero negócio – agora exigem da polícia que seja mais enérgica com os vendedores de viagens.
Temem o monstro que ajudaram a criar e alimentaram nos tempos em que as festinhas de gente bacana era embalada pelas drogas. A maconha ajudava "a descontrair, a ser mais alegre".
Para a felicidade dos pobres – que não sabiam o quanto eram felizes -, droga não entrava em suas casas. Era coisa – como tantas outras, ainda hoje – exclusivamente para quem tinha dinheiro.
Como tudo o que não presta, a "coisinha inocente" se agigantou. Deixou conquistadas as mansões e os apartamentos e ganhou até mesmo os casebres. Das redações de jornais, das reuniões de intelectuais e endinheirados, passou a ser frequentadora assídua também dos canteiros de obras.
E promoveu uma desgraçada "igualdade de classes". Escravizou igualmente a milionários, remediados e pobres, amarelos, brancos e negros, doutores e analfabetos. O antes "rejeitado" ou "excluído" passou a ser "mano".
Em poucos anos, sabe-se lá quantos milhões de pessoas mergulharam neste mundo. Os "cigarrinhos charmosos de maconha" foram substituídos por muitas outras drogas pesadas.
O monstro nelas encerrado produziu sementes, que, regadas sem prevenção e sem repressão, deram frutos rapidamente multiplicados: a violência.
E ela fez o caminho inverso em larga escala. Saiu dos barracos para as mansões, onde filhos que sempre tiveram tudo passaram a matar os pais, os avós, em busca do algo mais que alimentasse esse monstro existente dentro de cada um.
O crack acelerou esse processo de destruição do ser humano, depois de dominar o mercado na maioria das cidades.
Primeiro sinal de alerta, em Uberaba, me foi dado pelo juiz criminal Ricardo Motta: "Estão sendo levados a mim (como usuários) homens trabalhadores, de mãos calejadas". Foi o registro inicial de que os tentáculos do crack eram maiores do que se imaginava.
O consumo deixou de ser "escondido" e se espalhou pelas festas populares.
Foi então que escrevi "Pobres pais, pobres filhos!" – artigo publicado neste espaço. Parece que somente aí muitos pais "caíram na real" que era ilusória a "proteção" que davam aos filhos sendo seus "motoristas particulares", representado pelo ato de levá-los e buscá-los em festas que não entravam.
Nesse intervalo de quatro a seis horas, muitos jovens se drogavam e voltavam para casa, escoltados pelos pais, como se houvessem apenas ingerido bebida alcoólica.
Quando a realidade foi exposta, veio o pânico. Poucos profissionais da área de saúde sabiam (e muitos ainda não sabem) como lidar com isso naquela época.
O crack, droga "barata" – pela qual se paga um preço muito alto, em verdade -, bestializou ainda mais o animal humano, ao ponto de se questionar se alguns deles não são simplesmente animais de instinto exterminador ainda mais apurado.
Mesmo na nossa até então pacata Uberaba, o crack espalhou a violência. Jovens passaram a se matar pelo controle de pequenos pontos de drogas ou simplesmente por "não gostar da cara do outro", quando a sua própria está cheia da droga.
Uma outra consequência disso foi a "explosão" do número de pequenos furtos e assaltos. A turma saiu à rua à procura de dinheiro. Qualquer calça pendura no varal passou a ter a imagem de uma pedra de crack no momento da fissura.
E nossos estabelecimentos prisionais – para maiores e menores de idade – passaram a ficar abarrotados (tanto que o cadeião implodiu diante de suas precariedades e da clientela crescente).
Na penitenciária, as estatísticas revelam que até 80% dos presos têm envolvimento com drogas ilícitas. Mataram por elas, sob o seu efeito ou são dependentes químicos.
Mata-se, morre-se e até "vive-se" pelas drogas.
O descaso com que o Estado tratou a segurança pública entre 1980 e início do terceiro milênio – como admitiu o vice-governador Antônio Anastasia em reunião com Anderson e membros do Conselho Municipal de Segurança, em fevereiro deste ano – se repete com as drogas.
Faltam programas sérios de prevenção e repressão, mesmo estando provada a relação entre as drogas e os principais crimes contra a pessoa e o patrimônio. E a sociedade fica como avestruz.
Os motivos são inúmeros: desinteresse, desconhecimento, ignorância, incompetência, medo, cumplicidade, rabo preso.
O combate às drogas, nas mais variadas formas, precisa também do engajamento da sociedade. É preciso sair do campo das lamentações para o enfrentamento do mal, sob pena de o lamento se transformar em desespero já experimentado por milhares de famílias uberabenses.
Para 2009, o município prepara a deflagração de uma grande campanha preventiva. Que haja o engajamento de todos – do simples mortal aos semideuses. A droga não é problema exclusivamente de polícia. É de todos.