Se alguém ainda duvidava da criatividade brasileira para judicializar a vida, eis um caso que merece aplausos, ou, melhor, latidos. Um homem resolveu processar a empresa onde trabalha porque foi mordido pelo próprio cachorro enquanto fazia home office. Sim, o animal era dele, o ambiente era a casa dele, mas, na cabeça desse cidadão, a culpa tinha que ser do empregador.
O caso é um tratado sobre como transformamos o trivial em drama jurídico. Imagine a cena: o sujeito está em casa, trabalhando remotamente, quando seu cão decide lhe dar uma mordida sabe-se lá por qual razão. Em vez de lidar com o problema como quem educa um pet ou, vá lá, assume um descuido, ele aponta o dedo para a empresa. Afinal, Homer já dizia: “a culpa é minha e eu coloco ela em quem eu quiser”.
E o que dizer do advogado que concorda em levar essa causa adiante? Por trás de cada processo absurdo há um profissional que, em tese, deveria ser o primeiro juiz da causa, como se aprende no início curso de Direito. Caberia a ele demover o cliente de transformar uma mordida canina (do próprio cachorro!!!) em indenização. Mas, se o filtro falha, o Judiciário acaba arrastado para o meio da confusão, virando uma espécie de confessionário onde despejamos nossas mágoas e tentamos arrancar uns trocados.
O que impressiona no episódio do home office não é só a ousadia de culpar a empresa por uma mordida do próprio cão. É o que ele escancara: uma sociedade que prefere terceirizar tudo, culpa, soluções e bom senso para o Magistrado. O Brasil já tem tribunais abarrotados, com milhões de processos empilhados (ou, atualmente, emperrados no PJe), envolvendo questões sérias e complexas. Ainda assim, achamos que o Juiz tem tempo (e paciência) para decidir quem paga o curativo da mordida do Floquinho.
Não me entenda mal. O direito à Justiça é sagrado e deve ser usado. Mas quando um sujeito transforma o próprio pet em caso de tribunal, estamos diante de outra coisa: a banalização desse direito e uma preguiça monumental de resolver conflitos por conta própria. Antes de acionar o advogado, não irrite o cachorro. O Judiciário não é veterinário, terapeuta ou babá de adultos mimados.
Enquanto continuarmos levando cada dentada da vida ao tribunal, o sistema vai afundar sob o peso das nossas picuinhas. E o cachorro? Ele provavelmente segue abanando o rabo e, como ajuizado que é, com vergonha alheia por seu dono.