REGINALDO LEITE

Os erros estratégicos da Volkswagen

Para uma marca que motorizou o Brasil com o inesquecível Fusca, a Volkswagen parece pouco (Leia mais...)

Reginaldo Baleia Leite
Publicado em 03/01/2015 às 10:26Atualizado em 17/12/2022 às 01:59
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Redator InterinDaniel Messeder

Para uma marca que motorizou o Brasil com o inesquecível Fusca, a Volkswagen parece pouco antenada às necessidades atuais do consumidor nacional. E o reflexo disso fica evidente nos últimos relatórios de vendas: o balanço comercial de janeiro a julho de 2014 mostra queda de 15% no número de veículos comercializados pela marca no país.

Para complicar, agora em novembro o Gol perdeu a primeira posição nas vendas acumuladas do ano, após ininterruptos 27 anos de liderança.

Coincidência ou não, a VW local anunciou no último dia 24 de novembro a troca de seu presidente para 2015. Sai o alemão Thomas Schmall, cujo último grande feito foi o lançamento do up!, e chega David Powels, atualmente Diretor Geral da VW África do Sul. Repare que, não por acaso, o comando da empresa por aqui vai passar às mãos de um executivo vindo de um mercado emergente como o nosso.

A queda da VW brasileira não vem de hoje. Desde os anos 1990, a marca vem “entregando” segmentos que dominava aos concorrentes. A Saveiro não sustentou a Strada e sua capacidade de se desdobrar em versões. A Parati não teve segunda geração e viu a Palio Weekend tomar seu lugar. Além disso, a VW é lenta em suas decisões. Demorou para pegar o filão dos aventureiros enquanto a Fiat já deitava e rolava, nunca fez um rival de verdade para o Ford EcoSport, deixou o Santana morrer sem entregar um substituto à altura e levou a velha Kombi até seu último suspiro, sem oferecer absolutamente nada em seu lugar.

Isso sem mencionar a história do Golf, abandonado à própria sorte em nosso mercado na quarta geração de 1998 até 2013, enquanto a Europa recebia a quinta e sexta encarnações do modelo. Ou ainda o caso do Polo, lançado por aqui com toda pompa e circunstância em 2003 e depois praticamente esquecido até seu fim de linha, previsto para este final de 2014.

Hoje a VW tem apenas um produto de última geração fabricado no Brasil, o pequeno up!. Com construção refinada e um moderno motor 1.0 de três cilindros, o carrinho é quase à prova de críticas da imprensa – nós do CARPLACE, por exemplo, somos fãs dele. As vendas, no entanto, estão longe da expectativa inicial. Dos 10 mil carros previstos por mês, o up! tem emplacado pouco mais de 6 mil unidades.

Executivos do setor automotivo afirmam que o up! é bom para a Europa, mas pequeno demais para o Brasil. E mesmo o acréscimo no balanço traseiro feito pela engenharia brasileira não foi capaz de igualar o sub-compacto aos rivais compactos em porte. Para piorar, o modelo chegou com versões pouco equipadas a preços salgados, enquanto o mercado já sinalizava que ninguém mais queria carro sem o “pacote básico” de ar-condicionado, direção, trava e vidros elétricos – vide Hyundai HB20, Nissan New March e novo Ford Ka.

Além de não alcançar o sucesso almejado, o up! ainda criou um problema para os companheiros de loja: ele envelheceu Gol e Fox, oferecendo uma plataforma mais moderna (com segurança cinco estrelas), carroceria com aços de alta resistência, construção refinada e ainda um motor de ótimo desempenho e baixíssimo consumo – oferecido em todos os up! e em apenas uma versão específica do Fox.

Por falar em motores, está aí outro ponto polêmico da VW brasileira: os novos e eficientes 1.0 12V e 1.6 16V só chegaram a uma pequena parcela da gama. Até mesmo o renovado Fox manteve os antigos 1.0 e 1.6 8V, quando o mercado esperava somente os novos propulsores. Quer um Fox 1.6 16V? Somente na versão de topo Highline, ou então no aventureiro CrossFox. Para ter o 1.0 do up! no Fox é preciso optar pelo Bluemotion.

Na linha Gol, o novo 1.0 sequer está disponível. E o 1.6 16V só aparece no Gol Rallye, de mais de R$ 50 mil, e na Saveiro Cross, também topo de linha. Pior mesmo só o caso do Voyage, que não recebeu nem o 1.6 16V. E a marca ainda criou uma confusão desnecessária com seus motores 1.6: o novo 16V é chamado de MSI, mas agora esta sigla também aparece no antigo 1.6 8V, pois a VW diz que as letras se referem à injeção multiponto sequencial. Resta ao consumidor ficar atento para não levar o antigo pelo novo sem saber.

Com o Gol perdendo posições (a próxima geração só chega em 2016), a VW hoje só se destaca pelas vendas da Saveiro e do Fox, e ainda assim eles não são líderes de suas categorias. Nem mesmo o atualíssimo Golf, ainda importado, consegue a liderança do segmento de hatches médios. Além disso, os modelos da marca terão de ganhar equipamentos para justificar seus preços.

Ou como explicar que um Fox Comfortline (que se autointitula confortável) não tenha ar-condicionado de série?A chegada de um presidente vindo de um mercado emergente como a África do Sul parece um bom começo para a nova fase da VW do Brasil. Estivesse ele no comando anteriormente, quem sabe teria mantido o projeto do novo Santana, previsto para 2014? Um carro espaçoso e com ênfase no custo-benefício, algo muito bem aceito por aqui. E o que dizer do Polo, que poderia ter sido renovado e estar brigando com o New Fiesta entre os hatches acima de 1 litro? E o jipinho Taigun, que tem a cara do Brasil e parece ter ficado apenas na fase de conceito?

A Volkswagen mundial tem o ambicioso plano de se tornar líder global de vendas em 2018, e para tanto o mercado brasileiro é fundamental. Acontece que hoje o consumidor nacional mudou, quer um carro mais equipado, moderno e o mais próximo possível do que é oferecido em mercados maduros. A VW tem excelentes produtos mundo afora, e capacidade de desenvolver muita coisa boa por aqui. O ano de 2015 será fundamental para iniciar uma nova estratégia, amparada pela chegada dos novos Jetta e Golf produzidos no Brasil. Bom trabalho a David Powels.

Daniel Messeder

(*) Escreve para o site Carplace

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