Carlos Paiva
O comandante do 4º BPM, tenente-coronel Waldimir Soares Ferreira, em entrevista à Rádio JM, disse que o crime em Uberaba não está concentrado
O crack vicia menos que cigarro
Eu costumo dizer que tenho dificuldades em aceitar aquilo que não entendo. Acredito que todos nós somos assim. Levei tempo para analisar, entender e aceitar que é mais fácil deixar o crack do que parar de fumar. Mas, calma, eu vou explicar e espero que você também entenda e aceite. Que o crack vicia e mata ninguém duvida. Que o crack gera problemas sociais, de saúde e de segurança pública também ninguém duvida, mas, repit deixar o crack é mais fácil do que parar de fumar (cigarros comuns). De início, soa estranho, mas garanto que faz sentido. O médico Dráuzio Varella, que dedicou boa parte de sua vida profissional cuidando de presos usuários de todos os tipos de drogas lícitas e ilícitas em presídios em São Paulo, disse em certa ocasião que: “Uma coisa que eu percebi olhando os presos é que o crack na realidade não vicia muito”. Mas, espere um pouco. Desde que cubro a editoria de Polícia, ouço dizer que o crack vicia a partir do uso de duas ou três pedras. É instantâneo. Para o médico Dráuzio Varella, isso não passa de um mito, não corresponde à verdade. Segundo uma pesquisa, 80% das pessoas que experimentaram o crack não se tornaram dependentes da droga. Não viciaram. Já o neurocientista americano Carl Hart, que já publicou vários livros, inclusive em português, garante que, para largar o vício do crack, é necessário o que ele chama de “reforço alternativo”, que nada mais é que algo que seja atraente o suficiente, como, por exemplo, uma paixão, carreira profissional, família, enfim, alguma coisa que motive largar a droga. É uma espécie de psicologia básica. Sendo assim, para as pessoas que estão na rua, sem perspectiva, não há “reforço alternativo”. Ficar sem crack, para elas, é pior, porque é obrigá-los a conviver com a realidade, com a sujeira, desesperança e, principalmente, a violência. Por isso que, embora o crack seja usado por gente de todas as classes e etnias, os brancos e os de classe média geralmente não se viciam, porque têm algo a mais a esperar da vida. Quase sempre, quem se dá mal são os mais pobres, os que vêm de famílias desestruturadas e membros de minorias raciais. Só para efeito de ilustração, no Brasil, segundo pesquisa da Fiocruz, a imensa maioria de quem chega ao fundo do poço é negra ou mestiça e 80% da população de usuários de crack é de pele escura. Sendo assim, caro leitor, o crack é a consequência de uma série de desajustes sociais, e não a causa. O Brasil tem hoje mais de um milhão de usuários de crack. E enquanto não houver políticas de tratamento dos dependentes químicos e, ao mesmo tempo, investimento no combate ao tráfico de drogas, estamos condenados a ver esse número crescer diariamente.
Sem distinção
O comandante do 4º BPM tenente-coronel Waldimir Soares Ferreira, em entrevista à Rádio JM, na tarde de terça-feira, 25, disse que o crime não está mais concentrado em alguns locais até pouco tempo considerados “zonas quentes” em Uberaba. O comandante tem toda razão; o crime vem fazendo vítimas nos quatro cantos da cidade e não distingue classe social. É democrático. Basta estar vivo para ser uma vítima.
Caldeirão fervilhante
Tenho uma saudade danada das chamadas “zonas quentes” (locais com maior incidência de crimes). Você sabia onde eram e as evitava. Simples assim. E hoje, o que devemos fazer? A cidade virou um caldeirão fervilhante. Enquanto o Estado segue perdido com suas forças de segurança, o marginal mostra-se atento às lacunas e as preenche com crimes e criminosos (gangues) e, ainda, dividem a cidade em áreas demarcadas e muito bem vigiadas.
Estatísticas
E já que estou falando de incompetência e inércia do Estado, de 1º de janeiro a 31 de julho de 2015, segundo a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), 63.175 pessoas foram assaltadas em Minas Gerais. Mentira. O número ultrapassa a casa dos 80 mil. Desde que o atual governo assumiu, a ordem é reduzir o número de assaltos, nem que seja maquiando os números. Não diminui na prática, mas sim na estatística.
Roubo em furto
E, a título de ilustração, o método de “diminuição” nos crimes de roubo utilizado pelo Estado para vender uma falsa segurança é antigo. Já foi usado por outros governos. O método é simples: a Polícia Militar (em todo o Estado) transforma roubo em furto. Só isso. Roubo é considerado crime violento, e furto, não. E mais: algumas vítimas não estão registrando o roubo, o que é um erro, mas não acreditam que será elucidado.
A diferença
E a diferença de furto para o roubo é gritante. Conforme o Decreto Lei 2.848/1940: furto (Artigo 155) é “subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”. Já o roubo (Artigo 157) é “subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência”. O Estado está nos roubando a verdade e impondo a mentira.
Em alta
E mesmo manipulando estatísticas, o governo de Minas Gerais admite o aumento de 18,41%, levando em consideração o mesmo período no ano passado. Simplificand se tem um segmento que está em pleno desenvolvimento e com promessas de dias ainda mais prósperos é o crime. Não tem crise. E não é só legislação que colabora com esse segmento cada vez mais próspero; o Estado não está investindo na Segurança.