Uma boa parte da literatura mundial dedicou milhares de seu tempo e espaço a falar da morte. É estranha a sedução dos escritores em escrever (ou falar) da sua despedida de sua hospedaria terrestre. Alguns até se especializaram: não tendo sua morte contratada escreveram sobre a morte dos outros, amigos ou inimigos. Para os amigos mortes heroicas ou suaves, a música angelical, harpas e anjos subindo juntos e cantando os caminhos do senhor. Os bandidos e safados sofriam pra cachorro, música e canto de calouros em programa de auditório vazio. A coisa boa ou má podia acabar por aí. Por algum tempo haveriam lembranças, soluços e choros até alguém já perguntando pela família e o feliz premiado pela herança. Pelo meu exercício profissional de médico já vi quase de tudo nesta hora H final. Nunca me conformei ou achei bonita a morte – afinal ela era minha inimiga, e da minha família, e de meus amigos. Agora pensei e posso comunicar aos meus amigos, com base pessoal da minha experiência: o momento da morte é sempre ignorado, não vale chorar por antecipação (porque também depois não terá tempo...). Minha experiência pessoal foi curta, esta última semana em nosso hospital. Entrei com uma “angina de peito”, um diabetes e uma coronária já velha e cansada. Meu time do São José e São Marcos deram-me todo o conforto e assistência, repassando ao meu Adib Jatene exames e medicações adotadas. Não vou dar de super-homem, um bacanaço superprotegido que em seus hospitais recebia tudo especial. É claro que recebe, devo e agradeço ao corpo hospitalar cuidados de primeiro time – afinal se me deixassem morrer iriam deixar gente sofredora e chorosa – eu bem mais que os outros, embora secando rápido. A bala passou perto e baixa do ouvido, mas aqui estou eu. Não conto vantagem, sei que não fui porque Ele não quis, mas não tive sofrimento algum por estar na alça grupal da mira. Apenas, companheiro, não tenha medo, esta é minha mensagem. A medicina atual vale demais... e a covardia pode puxar para menos. Não é lorota, estas já me apareceram mal-acordado e sonhador. Não olho mais a meninada ouriçada em ganhar cargos e dinheiro – estes podem matar. Aqui de novo no fundão bambeio a rédea do meu cavalo, vou a passo. A dizer a verdade, tenho dó da turma afobada correndo atrás dos sonhos, da ilusão. Lembram-se do que já lhes escrevi... devagar e manso se desata qualquer enlaço, janeiro afofa o que dezembro endurece... Dino, fique me esperando, que não tenho pressa!