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Dois irmãos uberabenses

Estimado leitor, Joaquim Silvério dos Reis Montenegro Leiria Grutes entrou para a história como o traidor da Inconfidência Mineira

Mozart Lacerda Filho
Publicado em 04/07/2010 às 14:12Atualizado em 20/12/2022 às 05:33
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Estimado leitor, Joaquim Silvério dos Reis Montenegro Leiria Grutes entrou para a história como o traidor da Inconfidência Mineira. Por causa da sua traição, dizem, Tiradentes, grande mártir brasileiro, foi levado à forca. Mas isso, evidentemente, você já sabia. O que você talvez não saiba é que Joaquim Silvério era dono da Fazenda da Caveira, uma gigantesca área de mais de oito milhões de metros quadrados, situada no município de Barbacena.

Em razão de dívidas acumuladas (motivo pelo qual aceitou participar da Inconfidência Mineira), o inconfidente traidor foi obrigado a se desfazer da propriedade, onde, posteriormente, se instalou o Sanatório de Tuberculose, clínica particular que passou a ser uma das mais importantes no tratamento dos tísicos.

Em fins do século XIX, o sanatório entrou em decadência e sua falência foi logo decretada. No seu lugar, em 1903, começou a funcionar o primeiro Hospital Psiquiátrico de Minas Gerais, que ofertava assistência aos alienados.

Por conta da crença defendida por alguns médicos da época, de que o clima de montanha era salutar para os que portavam doenças nervosas, foram instalados, em Barbacena, outros sete hospitais psiquiátricos, legando ao município o título de Cidade dos Loucos.

O hospital, no auge de seu funcionamento, chegou a abrigar cerca de cinco mil internos, que chegavam de todos os lugares do Brasil, acomodados em um trem que estacionava na frente dos pavilhões. Esse veículo ficou conhecido como Trem dos doidos.

A maioria das pessoas eram internadas e, de lá, nunca mais saíam. Chegavam ainda jovens e nunca mais viam suas famílias. Os pacientes tinham as mais diversas origens: garotos considerados desobedientes por pais e professores; moças que, para o azar da família, tinham perdido a virgindade ou que engravidavam solteiras; presos políticos e todos os indesejáveis da sociedade.

Uma das formas de tratamento utilizadas com relativa frequência pelos médicos desse hospital foi a psicocirurgia: intervenções que consistiam em desligar os lobos (por isso lobotomia, outro nome dado à cirurgia) frontais direito e esquerdo de todo o encéfalo, visando a modificar comportamentos ou a curar doenças mentais. Segundo alguns estudiosos, essa cirurgia foi praticada em muitos hospitais psiquiátricos brasileiros entre 1939 e 1960, aproximadamente.

Pois bem. Dois irmãos uberabenses, por volta de 1955 ou 1956, foram alvos da psicocirurgia. Com a ajuda de um renomado médico e de um vereador da cidade, que era da família dos dois pacientes, seus pais conseguiram enviá-los ao hospício de Barbacena e, em menos, de seis meses de internação, foram lobotomizados.

Segundo testemunhos orais, os motivos que levaram a tal atitude foi o suposto uso abusivo, por parte dos irmãos, de álcool e de drogas. Em função disso, ficavam agressivos e ameaçavam os demais moradores da casa. Alguns depoimentos dão conta de que eles, em mais de uma ocasião, agrediram os próprios pais.

Esse comportamento dos irmãos não era bem visto pela sociedade e, depois de anos tentando vários tipos de tratamento, inclusive fora do País, a família acabou tomando essa decisão radical, já que os efeitos da psicocirurgia são irreversíveis.

O mais curioso é que, tentando resolver um problema, outro foi criado. Ao regressarem para Uberaba, a notícia se espalhou, e os dois irmãos tornaram-se alvos da curiosidade das pessoas. Se, antes, eles eram alcoólatras; agora, eram operados. A família, então, se desfez de seus bens e teve que ir embora, dizem que para o Rio de Janeiro. Ambos faleceram na década de setenta.

Bom domingo a todos.

(*) doutorando em História e professor do Colégio Cenecista Dr. José Ferreira, da Facthus e da UFTM

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