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Dois vizinhos

Numa mesma rua moravam dois senhores. O primeiro tinha a seu dispor um palacete, erguido em dois pavimentos. À frente daquela imponente morada...

João Eurípedes Sabino
forumarticulistas@hotmail.com
Publicado em 03/08/2018 às 10:18Atualizado em 20/12/2022 às 13:38
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Numa mesma rua moravam dois senhores. O primeiro tinha a seu dispor um palacete, erguido em dois pavimentos. À frente daquela imponente morada existia um vasto jardim, limitado na rua por suntuosa grade em ferro batido.

O outro senhor tinha por caminho aquele lugar e, todos os dias, por ali ia e vinha a pé. Um casebre o abrigava lá... no fim da rua, num lugar já fora da cidade.

Os padrões materiais das duas casas e de seus donos eram contrastados, mas isso não impediu que aqueles “vizinhos” se cumprimentassem quase que diariamente. Tudo começou certo dia, com um simples aceno de cabeça de ambos. Aquela amizade evoluiu para sucessivas conversas, que aconteceram ali naquele portão monumental.

O abastado morador da rua não se via assim e era muito simples, tanto que, por várias vezes, guardou o seu opulento carro para deixar a calçada livre aos passos do amigo. Os dois tinham o mesmo patrimônio inalienável: a simpatia.

Um dia o dono da mansão, por motivos de urgência, saiu de madrugada com a família, bem antes de o sol nascer. A pressa e a escuridão não lhe permitiram ver que o portão de comando eletrônico ficara aberto. A casa ficou literalmente desguarnecida, apesar dos sistemas de câmeras e cerca elétrica estarem ligados.

Por dois dias seguidos, ao passar diante da casa entregue ao léu, o “vizinho” caminhante ficou intrigado e agiu incontinênti. Tocou o interfone por cinco vezes e não foi atendido. Ficou pensativo e falou consigo mesm “Nada tenho..., nada sou..., mas alguma coisa preciso fazer...”. E fez. Trouxe o seu cachorro e o colocou no jardim do casario para vigiar a entrada. Tomou outras providências que o leitor conhece, sem nenhum efeito e, diante das quais, optou por dormir nos fundos da garagem. Ninguém ousou invadir a residência, bem vigiada por aquele homem e o seu cão. O vira-lata escorado pelo dono desempenhou muito bem a sua missão.

Na noite seguinte, chegou o morador da casa e, ao ver de longe o seu portão aberto, ficou atônito. “Meu Deus; arrombaram minha casa!?”, disse, desesperado. A família entrou em pânico e quase perdeu as forças para se aproximar. O cão posicionou-se e recepcionou os legítimos moradores. Dos fundos da garagem levantou-se o “vizinho”, que na penumbra parecia tratar-se de um homem de rua. As crianças e a mãe não o conheciam, mas o pai sim, e disse-lhes: não se desesperem; nossa casa ficou entregue a um grande amigo. E entrou com o carro na garagem...

O vigilante recebeu o proprietário da casa, explicou-lhe o ocorrido, ganhou abraços e depois desamarrou da grade o seu cachorro amigo. O momento foi regado por intensa fluidez de sentimentos. Antes de se despedir, o vizinho do fim da rua relembrou os cumprimentos diários, a atenção trocada por ambos e sentenciou: “As pessoa certas, no lugar certo e nas horas certas; só se encontram por obra de Deus... Não foi por acaso que um dia nos encontramos”. O distante morador chamou seu cachorro e partiu.

(*) Presidente do Fórum Permanente dos Articulistas de Uberaba e Região e membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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