Ninguém duvida de que a mentira está instalada em nosso relacionamento. No dia a dia de todos nós. Não há como livrar-nos dela. A mentira é fruto inevitável daquilo que a Sociologia chama de “eu social”. Já ouvimos milhões de vezes, a afirmação de que o homem é um animal que se comunica. Essa comunicação, porém, é pontuada por verdades e mentiras. Vez por outra, a verdade transparece. No mais dos casos, a mentira prevalece.
Todos nós mentimos: você, eu, o candidato político, o médico, o advogado (!), o padre, o bispo, o jornalista, o negociante, todos. Vi crianças de dois anos já iniciadas na arte de mentir.
Você já pensou se só falássemos a verdade? Se revelássemos aos outros o que estamos pensando? Seria um desastre. Estaríamos rodeados de inimigos. A mentira coopera para a paz social.
A própria linguagem do dia a dia, às vezes, diz uma coisa para significar outra. Assim, quando dizemos “pois não” é para significar “sim”. Quando dizemos “pois sim” é para significar “não” e, ainda por cima, com ironia. Quando dizemos “absolutamente” (que é afirmativo), queremos significar “de jeito nenhum”.
Quase todos nós, quando crianças, lemos o famoso livro de Carlo Collodi, o “Pinochio”. O autor escolheu o nariz como símbolo da mentira. Ainda bem que é apenas um símbolo. Caso contrário, todos nós seríamos donos de narizes enormes, principalmente os políticos em campanha.
Platão, o filósofo grego, sugeriu que expulsássemos os mentirosos da vida política. Quem ficaria? Seria até bom se não mentissem. Já imaginaram o Fernando Henrique e o Lula se abraçando e realçando as virtudes e qualidades um do outro? Para Platão estariam fora da “res publica” sem apelação. Muitas vezes, camuflamos a mentira com outros nomes. É comum o mentiroso ser chamado de exagerado ou, então, dizer que o fulano tem o dom de saber ocultar a verdade. Um e outro são mentirosos, só que mais vivos do que os outros.
O problema maior é quando lemos aquele mandamento de Jesus: “Seja o vosso sim, sim; o vosso não, não”. Nessas alturas, as coisas se complicam. O mandamento é muito difícil. Aliás, Jesus só nos pediu coisas difíceis. É um chamado ao heroísmo. Amar o outro como a nós mesmos, servir sem esperar pelo retorno, perdoar os que nos ofendem, ser tolerante, compreensivo, paciente, misericordioso, hospitaleiro, humilde, generoso, tudo isso é muito difícil.
Proclamar-se católico, protestante, crente, exorcista, evangélico, tudo isso é muito fácil. Carregar rótulos é muito fácil. O difícil mesmo é ser cristão. Conheço católicos que são péssimos cristãos. Crentes, idem.
Você não acha que os “rótulos”, às vezes, são uma tentativa de ocultar a mentira que está bem no fundo de nós mesmos?
Fugir da mentira é uma virtude. É, sobretudo, uma arte que nem todos conseguem. Vale o esforço.