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Estresse tem cura

Era a terceira vez que iria pescar naquela semana de abril. Ainda não estava aposentado...

Padre Prata
thprata@terra.com.br
Publicado em 11/12/2016 às 12:37Atualizado em 16/12/2022 às 16:14
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Era a terceira vez que iria pescar naquela semana de abril. Ainda não estava aposentado. Mas sua consciência profissional não o acusava de falta grave. Nada disso. Só que dentro da cabeça alguma coisa lhe doía. Uma dorzinha intermitente. Matreira. Uma dorzinha que não era dor de corpo. Parecia mais um conselh será que você não está pescando demais?

Conversava com os amigos, ia ao mercado, contava piadas, fazia longas caminhadas. Tudo bem. Não podia era ficar quieto. A dorzinha voltava. Pior do que pedrinha no sapato. Pedra a gente tira do sapato e joga fora. Mas como jogar a cabeça fora? Deixar a esposa e os filhos pequenos pela terceira vez naquela semana era coisa de irresponsável. Tinha ido no domingo. Tinha ido na terça. Agora na quinta outra vez? Aquilo era exagero. Seu sócio tomaria conta da oficina. Tinha encomendas com datas marcadas. Não, não vou. Acima de tudo o dever, como lera num livro de formação ética. Além disso, com esse frio fora de tempo, não iria pegar peixe nenhum.

De decisão tomada, foi procurar seu amigo, conhecedor dos melhores pontos no Rio Grande, para dizer-lhe que não iria. Foi seu grande erro. O amigo abriu o freezer e mostrou-lhe o conteúdo. Não acreditou no que via. Eram quatro ou cinco piracanjubas, daquelas enormes, de barbatanas vermelhas. “Tudo pescado lá no Rio Grande. Descobri o ponto, perto da Fosfértil, numa meia correnteza.”

Voltou para casa cozinhando um drama. Afinal de contas, não iria prejudicar ninguém. O supermercado já está feito, não iria gastar nada, o carro era do amigo. Gastaria apenas com um lanche, duas latinhas de cerveja, meia dúzia de bananas. Só. Mais nada.

Quinta-feira, às 6 horas da manhã, o carro já comia chão com apetite. É verdade que a dorzinha na consciência voltara na véspera. Não dormira bem. Não estaria abusando? Não entendia a razão do conflito. Deixara dinheiro em casa para alguma emergência. Já estava cansado daquele barulho da oficina. Lembrou-se de um artigo que tinha lido e que falava de decibéis. Dentro de dez anos, 20% da população das grandes cidades estaria surda.

Foi porque se sentia estressado que procurara um médico. Lembrou-se do conselho dele. Foram palavras de sabedoria e experiência. “Velho, você está ficando nervoso, irritado, agressivo, maníaco. Você precisa urgentemente de uma terapia. Por que não vai pescar.” Gente, por que não tinha pensando nisso antes? Pescar não era vício. Era terapia. Contato com a natureza, com a mansidão da água. Como dissera o médico, era hidroterapia.

Já estava dentro da canoa quando sua consciência, vencida, fora dormir. Lembrou-se de uma frase de um padre amig “Meu filho, Deus nos criou para que a gente seja feliz”. Santo padre aquele...

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