ARTICULISTAS

Eu era aquariano

Acredito que a frase seja de Guimarães Rosa: Eu não sei de nada não, meu Senhor

Gilberto Caixeta
gilcaixeta@terra.com.br
Publicado em 08/02/2011 às 19:22Atualizado em 20/12/2022 às 01:48
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Acredito que a frase seja de Guimarães Rosa: “Eu não sei de nada não, meu Senhor, mas desconfio de muitas coisas”. Sempre desconfiei da finitude do Universo, quando tentam me provar a sua infinitude, como sempre desconfiei, também, das aulas de religião em sala de aula; ali não é local para esse tipo de conhecimento. Sala de aula é espaço de debates, o que religião não requer, por ser a força da fé.

Desconfiava também da roda dos zodíacos, porém, me sentia aquariano. Procurei introjetar em meu inconsciente os seus predicados e, em correspondência ao meu mês de nascimento, a minha protetora Santa Escolástica, irmã de São Bento de Nurcia. Ambos viviam a clausura beneditina e só se encontravam uma vez no ano, para falar das coisas espirituais. Quando Escolástica pressentiu a sua morte, implorou ao irmão que ficasse mais tempo com ela naquele dia. São Bento, não querendo quebrar as regras do monastério, não a atendeu. Então, ela pediu a Deus que ele ficasse, e, após alguns minutos, uma tempestade começou. Vendo a situação, Bento disse: “Deus todo poderoso, perdoai minha irmã pelo que ela fez”, ao que ela respondeu: “Eu pedi um favor a ti e não me ouvistes; pedi a Deus e Ele me ouviu”. Mais tarde, São Bento viu a alma da irmã subir aos ceus.

Busquei, também, no mundo dos Orixás a correspondência ao meu signo; encontrei Oxossis. Guerreiro, protetor das matas, poderoso na natureza. Protegido, assim, fui à luta. De um lado, o mundo grego; do outro, o Cristão, e na retaguarda, o Orixá. Como o Universo é finito, a Ciência pode estudá-lo e, paulatinamente, descortiná-lo em novas realidades em sua expansão, agregando saberes ao desconhecido humano. Foi assim que surgiu mais uma constelação no zodíaco, o Serpentário. Esse achado foi um golpe em minha vida. De um dia para o outro, deixei de ser aquariano, perdi o meu orixá e agora sou capricórnio, com outro oxirá. Só ficou a Santa Escolástica.

Depois falam que Ciência não caminha com religião. Ela não caminha com ninguém nem com os cientistas, a cada dia um desmente o outro. Vivi como aquariano, senti e pensei como aguariano e, agora, não saberei ser capricorniano. Por isso, quero ser indenizado pelo Estado, que permitiu a ilusão, que me proveu com uma educacão mitológica. Se guerrilheiros e terroristas de 64 podem ser indenizados e os torturadores, anistiados; as tetranetas de Tiradentes receberão pensão indenizatória, enquanto que as bisnetas já recebem, eu, que estou sendo torturado pela decepcão do meu zodíaco e que alimentei o Orixá errado, não posso? E no mais, sou filho de Santa Escolástica, a quem Deus atendeu, enviando a tempestade. Se nada disso bastar, alegarei então alienação em minha racionalidade. Alegarei, assim, que sala de aula não é lugar de religião, pois o Estado é laico.

(*) professor

 

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