Depois de escolher alguns produtos em um supermercado, dirigi-me a um dos caixas. Optei por fazer valer o meu direito, escolhendo o do atendimento para idosos, gestantes
Depois de escolher alguns produtos em um supermercado, dirigi-me a um dos caixas. Optei por fazer valer o meu direito, escolhendo o do atendimento para idosos, gestantes e deficientes físicos. Na fila, só havia uma senhora.
De repente, dois meninos correram e se colocaram à minha frente. Estariam distraídos? Chamei a atenção deles para a placa de atendimento preferencial. Um dos meninos se afastou, mas o outro, com um embrulho de pães na mão, acintosamente, puxou-o de volta. Fiquei tranquilo; tinha certeza de que o funcionário faria valer a lei.
Para minha surpresa, ao terminar de atender a senhora à minha frente, o caixa se voltou para mim e explicou: “Vou passar esses dois meninos, pois eles têm só um pacote de pães.” Por mim, tudo bem. Sou um ser humano possuidor de uma santa paciência. Já superei momentos ruins de verdade.
Finda a compra, aquele que se julgava o mais esperto dos dois proclamou, vitorios “Minha mãe me ensina a passar na frente dos outros.” E se foi. Com ele, foi-se, também, a oportunidade de ele aprender um pouco sobre respeito e ética.
Houve um tempo em que a família primava por ensinar aos filhos valores humanos dos quais a sociedade depende, como moral, cidadania, amor ao próximo... Complementar essa educação era a tarefa da escola, hoje temerosa de enfrentar um número nada irrisório de alunos inconsequentes, capazes de agredir colegas, professores e funcionários; alunos capazes de se valerem das drogas dentro e fora do espaço escolar.
A atitude grosseira daquele garoto tinha a conivência da mãe, uma figura extremamente marcante na vida de qualquer filho. Se as palavras do menino forem mesmo verdadeiras, essa mãe estaria usando o filho e levando-o a um comportamento inadequado, inconveniente, inaceitável. Por acreditar na mãe, o mais provável é que ele termine por achar natural levar vantagem em detrimento da comunidade. E, se ele não conseguir isso, talvez tente resolver seus problemas no grito, no tapa, no tiro.
Muitas de nossas crianças têm sido usadas por adultos cruéis, para pedir esmola nas ruas, para roubar, para vender drogas, para ser, elas próprias, humilhadas, maltratadas, feridas. Conversei com o caixa do supermercado. Era o mínimo que eu poderia fazer naquele momento. Se insistirmos em ficar mudos e cegos diante dessas cenas, seremos parceiros na criminalidade, na fome, na miséria.
Por um futuro de sabedoria e paz para essas crianças, não sejamos omissos!
(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro