PREJUÍZO

Associação confirma crise das operadoras de planos de saúde e defende reajuste

Presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde em MG afirma que os custos aumentaram muito com as novas coberturas aprovadas pela ANS

O Tempo
Publicado em 10/09/2023 às 09:35
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Após um levantamento da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) apontar que as empresas de planos de saúde devem atualmente cerca de R$ 2,3 bilhões para 48 hospitais do país, o diretor-presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde em Minas Gerais (Abramge/MG), Celso Dilascio, confirmou que o setor passa por grave crise financeira e defendeu um reajuste dos valores cobrados dos clientes. Segundo ele, houve um aumento muito grande das coberturas, ao mesmo tempo em que a receita das operadoras ficou represada.

“A gente enxerga que um aumento desproporcional das coberturas deveria fazer frente a um aumento das receitas, portanto, um reajuste do preço dos planos de saúde. Ultimamente temos visto grupos no Congresso Nacional, de uma maneira geral, e políticos interferindo nas coberturas, trazendo procedimentos experimentais, sem comprovação ou inovadores, que infelizmente têm custos muito altos. E o que se tem visto desde a metade da pandemia para cá é que a sinistralidade, em consequência, aumentou muito nas operadoras”, afirma.

De fato, em abril de 2021, entraram em vigor 69 novas coberturas obrigatórias dos planos de saúde, que foram acrescentadas ao Rol de Procedimentos após autorização da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Fazem parte da lista 19 medicamentos orais que cobrem 28 indicações para tratamento de diversos tipos de câncer; 17 imunobiológicos com 21 indicações para tratamento de doenças inflamatórias, crônicas e autoimunes, como psoríase, asma e esclerose múltipla; um medicamento para tratamento de doença que leva a deformidades ósseas; e 19 procedimentos entre exames, terapias e cirurgias para diagnóstico e tratamento de doenças do coração, intestino, coluna, pulmão e mama, entre outros. 

Além das novas coberturas, os planos de saúde também enfrentam um outro problema atualmente: a demanda reprimida. Desde o ano passado, alguns procedimentos eletivos puderam ser retomados após os casos de Covid-19 diminuírem no Brasil e a vacinação contra a doença ter sido aplicada em boa parte da população. 

Durante muitos meses, apenas procedimentos de caráter emergencial podiam ser realizados, o que fez com que consultas, exames e cirurgias menos complexas ou que não eram urgentes sofressem uma grande procura a partir do momento em que foram liberados novamente. Isso, claro, sobrecarregou os planos de saúde, que desde então enfrentam dificuldades operacionais e financeiras para aguentar toda a demanda.

“O que se tem visto, desde a pandemia, é que a sinistralidade aumentou muito nos operadores. Como toda operadora tem carregamento comercial, tem custos para comercializar produtos, tem impostos a pagar, tem equipe, tem folha de pagamento e outras despesas, a grande maioria das operadoras tem ficado no vermelho”, justifica Dilascio.

E ele defende uma mudança urgente na cadeia para evitar que a crise das empresas de planos de saúde fique ainda maior. “Algumas operadoras gigantes que têm hospitais próprios ainda conseguem se defender, mas nós vemos no segmento uma dificuldade muito grande. Eu acho que tanto o Ministério da Saúde, a ANS, políticos, o governo federal e o setor precisam sentar e rever regras, porque nós estamos vivendo um grande desequilíbrio”, explica.

O diretor-executivo da Associação Nacional de Hospitais Privados, Antônio Britto, também defende mais diálogo para que seja encontrada uma solução para toda a cadeia da saúde suplementar. “Estamos diante de uma crise que não é só de um segmento do setor de saúde. É do sistema. E essa crise não vai se resolver com um segmento tentando ajustar seus problemas às custas do outro. Precisamos de um grande diálogo setorial com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)”.

E o diretor-presidente da Abramge/MG sugere ainda a regulação de toda a cadeia, não apenas das empresas de planos de saúde. “A saúde suplementar envolve quatro entes: os pacientes; os hospitais, médicos e prestadores de serviço de saúde; a indústria farmacêutica e as operadoras. Mas só as operadoras são reguladas”, destaca.

Na opinião dele, os outros lados da cadeia também deveriam sofrer maior fiscalização. “Isso pode evitar muitas fraudes de reembolso, de solicitações indevidas, de venda de pacientes em situações graves que burlam as carências previstas em lei”, avalia. 

Fonte: O Tempo

Reclamações contra planos de saúde chegam a quase 900 por dia
Anna Beatriz Maria Colli escreveu um longo depoimento no Instagram da operadora de saúde que atende o filho de seis anos. Seu objetivo era solicitar a troca da sonda de gastrostomia e a traqueostomia.

Richard tem paralisia cerebral e, no fim do ano passado, engasgou com um pedaço de pão durante uma convulsão. Ele sofreu uma parada cardíaca que comprometeu a oxigenação no cérebro e depende de equipamentos para respirar e se alimentar. "Já é um sofrimento tudo que estamos passando, e ainda não facilitam", diz o post de Colli. "Precisamos recorrer através de reclamações."

Como a família de Richard, muitos têm utilizado o registro de queixas -nas redes sociais, na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) ou no Judiciário- para tentar solucionar problemas com planos de saúde. Só na agência, as reclamações passaram de 67.690 entre janeiro e julho de 2019, antes da pandemia de Covid-19, para 185.426 no mesmo período deste ano. São quase 900 reclamações por dia.

Apenas os registros por prazo máximo de atendimento -quando as operadoras ultrapassam os prazos previstos na tabela da agência para consultas e tratamentos- saltaram de 4.666 para 29.035, um acréscimo de 522%.

Questionadas, as entidades que representam as operadoras afirmam que as empresas estão trabalhando para melhorar a infraestrutura de atendimento e os sistemas, destacam que os planos têm canais próprios para reclamações e que a taxa de resolutividade no setor supera 90%.

Principais reclamações
Pai de Richard, Wagner Santos diz que foram vários apelos em redes sociais e três registros de reclamação nos canais da ANS desde outubro. Primeiro, para transferir o garoto do hospital público no Jabaquara, na zona sul paulistana, para um conveniado em Diadema, na Grande São Paulo.

Depois, para pedir assistência domiciliar ("home care") e, agora, para a troca dos equipamentos.

"Procuramos uma advogada porque falta muita coisa. O plano não fornece fraldas, medicamentos para convulsão e proteção gástrica, equipos para nutrição. O que não encontramos no SUS estamos comprando com vaquinhas", afirma Santos, que contratou em 2017 o plano para os três filhos.

Segundo a ANS, dificuldades com reembolso e rede conveniada também foram registradas com frequência em seus canais, algo que para a advogada Juliana Hasse, presidente da Comissão de Direito Médico e de Saúde da OAB-SP (Seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil), pode estar relacionado à ausência de informações claras sobre o contrato firmado com a operadora de saúde.

"Grande parcela dos planos é adquirida por meio de convênios corporativos e o usuário não tem uma compreensão precisa do que foi contratado, do que está ou não incluso", explica. Os planos de saúde individuais e familiares abrangem cerca de 8 milhões de beneficiários, ou 16% dos 50,6 milhões de consumidores de planos de assistência médica no Brasil. Os demais estão em planos empresariais ou por adesão (contratados por meio de sindicatos e associações).

Outra diferença entre as modalidades, aponta Hasse, está no percentual de reajuste. Para planos individuais e familiares, há um teto de aumento estabelecido pela ANS, enquanto o percentual de revisão dos planos coletivos é determinado a partir de negociações das próprias operadoras, o que também gera críticas. Nos sete primeiros meses deste ano, foram 8.413 reclamações na agência referentes a mensalidades e reajustes.

Problemas com rol de procedimentos e coberturas também cresceram: foram 12.091 reclamações na ANS nos primeiros sete meses de 2019, contra 16.634 neste ano.

"Muitos planos negam tratamentos que foram determinados pelos médicos e tentam realizar procedimentos mais simples e baratos", diz o advogado Fabrício Posocco.

Ele menciona, por exemplo, negativas das operadoras para oferecer "home care", como ocorreu com a família de Richard. "São situações que tornam complicadas as relações entre pacientes e planos e causam aumento de reclamações." De acordo com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), no fim de 2022, havia 520 mil processos referentes à saúde em tramitação.

Por outro lado, Hasse lembra que também entram nessa categoria usuários que desejam, por exemplo, realizar cirurgias estéticas e tentam enganar as operadoras apresentando os procedimentos como reparadores --estes com cobertura prevista. "Cada caso é um caso, é difícil padronizar ações de saúde", diz a advogada.
Como mostrou a Folha, as operadoras de saúde têm obtido na Justiça decisões favoráveis contra esquemas de fraudes que envolvem pedidos irregulares de reembolso por consultas e exames.

De acordo com dados da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), que representa grandes grupos do setor, de 2019 a 2022 o volume total gasto pelas empresas com reembolsos saltaram de R$ 6 bilhões para R$ 11,4 bilhões, um aumento de 90%.

Crise chega aos hospitais
A crise no setor chegou aos hospitais, que relatam atrasos de pagamentos que somam, pelo menos, RS 2,3 bilhões.

Para a advogada Hasse, o caminho para a redução das reclamações passa por mudanças na gestão dos planos, incluindo incentivo à medicina preventiva, reavaliação da rede de atendimento e alteração do sistema de remuneração dos médicos, do modelo baseado na quantidade de casos atendidos para outro focado no sucesso da conduta.

O que dizem as operadoras?
Em nota, a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) reforça a importância dos planos de saúde no país e o esforço das operadoras para atender às necessidades dos beneficiários diante dos prejuízos operacionais.

"O setor também tem enfrentado impactos significativos decorrentes de diversas fraudes, incluindo empréstimos e falsificação de carteirinhas, uso indevido para procedimentos estéticos, reembolsos duplicados de consultas e fraudulentos, além de materiais superfaturados", diz.

Segundo a associação, as operadoras estão trabalhando para ampliar a infraestrutura de atendimento, melhorar sistemas e organizar redes e, assim, "trazer a saúde suplementar brasileira para uma rota de sustentabilidade que promova o acesso ao sistema privado de saúde".

Já a FenaSaúde ressalta que os usuários podem tentar uma resolução direta com a operadora antes de registrar reclamação junto à ANS, e que a taxa de resolutividade no setor é alta.

"Todas as associadas oferecem canais de atendimento e ouvidoria para esclarecimentos, dúvidas e tratativas diversas. As demandas recebidas são utilizadas para aperfeiçoamento de processos e a grande maioria dos casos são resolvidos sem que seja necessário acionar instâncias externas."

Como funciona a reclamação à ANS?
A ANS é o principal canal de recebimento de demandas de usuários de planos de saúde no país e atua na intermediação de conflitos entre beneficiários e operadoras por meio da NIP (Notificação de Intermediação Preliminar). A ferramenta foi criada para agilizar a solução de problemas relatados pelos consumidores, com taxa de resolutividade superior a 90%.

Pela NIP, a reclamação registrada nos canais de atendimento da agência é automaticamente enviada à operadora responsável, que tem até cinco dias úteis para resolver o problema, nos casos de cobertura assistencial, e até dez dias úteis para demandas não assistenciais.

Se o problema não for resolvido pela NIP e se constatada infração à legislação do setor, é instaurado um processo administrativo que pode resultar em sanções, entre as quais a aplicação de multa. (Stefhanie Piovezan/ Folhapress)

Fonte: O Tempo

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