TRABALHO INFANTIL

Trabalho infantil diminui no Brasil, mas Minas ainda lidera lista nacional, com 214 mil casos

As estatísticas incluem, por exemplo, meninas contratadas como empregadas domésticas e meninos que vendem bala nas ruas

O Tempo/Gabriel Rodrigues
Publicado em 14/11/2024 às 08:39
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Alguns setores, como a construção e civil e o trabalho doméstico, não podem empregar nem adolescentes maiores de 16 anos. (Foto/Valter Campanato/Agência Brasil)

Há boas notícias que não devem ser comemoradas, como a diminuição do trabalho infantil em Minas Gerais. O Estado teve uma redução de quase 10% do número de crianças e adolescentes nessa situação entre 2022 e 2023. Ainda assim, lidera o ranking nacional de Estados e tem o maior número de menores de idade trabalhando irregularmente: são quase 214 mil pessoas vivendo dessa forma, segundo a Auditoria Fiscal do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em 2022, eram 237 mil, isto é, em um ano, cerca de 23 mil pessoas deixaram o trabalho infantil. É um ritmo contínuo de diminuição: em comparação a 2019, quando o valor passava de 282 mil, o número caiu aproximadamente 24%. Em 2024, até setembro houve novas 367 fiscalizações que detectaram esse tipo de atividade no Estado. No Brasil, o total de menores trabalhando chega a 1,6 milhão, queda de 14,6% em um ano.

São trabalhos de diversas naturezas. As estatísticas incluem, por exemplo, meninas contratadas como empregadas domésticas e crianças responsáveis por cuidar dos irmãos mais novos e da casa. Coordenadora do Fórum de Erradicação e Combate ao Trabalho Infantil, Elvira Cosendey destaca a gravidade do contingente de meninos que vendem balas nas ruas dos grandes centros urbanos.

“O núcleo duro do trabalho infantil são os meninos que fazem venda ambulante. Eles fazem essas vendas porque a sociedade não está esclarecida o bastante para saber que faz um mal em manter essas crianças nas ruas. Belo Horizonte é uma cidade que puxa o número para cima. É absurdo, vergonhoso. Temos corredores como a Alberto Cintra, a avenida Fleming, a Portugal, a rua Curitiba, a Savassi e o centro da cidade”, diz. Não é raro, diz ela, que, nas ruas e lidando com o dinheiro desde cedo, essas crianças acabem se tornando trabalhadores do tráfico de drogas. Também é comum que elas mesmas não percebam o mal em trabalhar desde cedo, negligenciando a própria educação.

Outra frente que concentra o trabalho infantil, especialmente feminino, é o serviço doméstico. É o caso da adolescente Ana (nome fictício), que aos 14 anos começou a trabalhar como babá em BH na mesma casa onde a mãe era diarista. “Eu cuidava da menina, lavava louça, descia com ela para brincar, e às vezes também ia a outros lugares, como a casa da avó dela. Eu trabalhava de segunda a sábado, sem horário fixo no fim de semana. Chegava muito cansada na escola e, nos finais de semana, se tinha trabalho de escola, não podia ir porque tinha que trabalhar. Eu perdia o foco e ficava muito cansada”, relata.

A irregularidade foi descoberta porque os patrões assinaram a carteira de Ana e, assim, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) detectou a idade dela. “É difícil identificar essas situações pela falta de denúncia, porque, dentro de casa, é um trabalho invisível. Se não houver denúncia, não é pego”, completa a coordenadora do Fórum de Erradicação e Combate ao Trabalho Infantil, Elvira Cosendey.

O que explica a diminuição do trabalho infantil?
Para o auditor fiscal do trabalho e coordenador nacional de fiscalização do trabalho infantil, Roberto Padilha Guimarães, a diminuição é resultado do reforço de políticas públicas e das fiscalizações e também de uma virada dos indicadores econômicos do país. “Tivemos a redução do desemprego. As famílias começam a ter mais renda, e isso acaba tendo reflexos”, pontua.

A baixa renda familiar é justamente um dos motores que empurra as crianças e adolescentes para o trabalho precoce, explica ele. “A pobreza é uma das causas mais importantes, mas não a única. Temos também aspectos culturais. Muitas vezes, o trabalho infantil é tratado como substituto para a educação, ou seja, adolescentes largam a escola, vão trabalhar e comprometem seu futuro, porque não consegue mais um emprego digno. Outra causa é a deficiência da educação, locais com ausência de escolas ou com escolas precarizadas”.

Erradicar o trabalho infantil demanda mais do que cuidado com as crianças. É preciso foco nas famílias, defende Elvira Cosendey, Fórum de Erradicação e Combate ao Trabalho Infantil. “A Constituição de 1988 tirou o foco da criança e do adolescente e o colocou nas famílias. Mas essa política ainda não é implementada no Brasil. A criança trabalhando é consequência de uma família desamparada”, diz. Na lista de medidas que podem minimizar o cenário atual, ela elenca expansão do ensino integral para todo o ensino fundamental e reforço da assistência social de cada município. 

O que pode ser considerado trabalho infantil?
O número de vítimas do trabalho infantil alcança 6,2% do total de crianças e adolescentes do Estado. Há situações em que o trabalho de menores de idade é permitido: a partir dos 14 anos, eles podem participar do programa de Jovem Aprendiz, que envolve somente empresas cadastradas e um curso de aprendizagem. Após os 16 anos, podem ser contratados como qualquer trabalhador, desde que não sejam submetidos a riscos ou a insalubridade no dia a dia.

Um decreto de 2008 lista as atividades em que o emprego de adolescentes é proibido inclusive aos maiores de 16 anos. Ela inclui canteiros de obras e trabalhos domésticos, por exemplo. “O trabalho infantil abrange atividades nas cidades, como trabalho em oficinas mecânicas, com comércio ambulante nas ruas, mendicância, catar recicláveis... Na cidade, são principalmente no setor de comércio e serviços. No meio rural, temos trabalho infantil na agricultura e na pecuária. Varia muito em cada região”, detalha o coordenador nacional de fiscalização do trabalho infantil, Roberto Padilha Guimarães.

As operações contra o trabalho infantil podem ser disparadas por informações coletadas pela Auditoria Fiscal do Trabalho ou por denúncias. As empresas onde a situação é flagrada são notificadas e podem receber uma multa. Os menores são encaminhados a uma rede de proteção, que inclui os Conselhos Tutelares e o Ministério Público, a fim de garantir a matrícula e a presença das crianças na escola e a inclusão de suas famílias em programas sociais, por exemplo. No caso de adolescentes a partir dos 14 anos, eles são incluídos no programa de Jovem Aprendiz, em que recebem todos os direitos trabalhistas. 

Também há casos em que a família é responsável por empurrar o menor para o trabalho. “Nesse caso, a família não recebe a mesma penalidade de uma empresa, mas uma notificação, uma orientação sobre as normas, e é encaminhada à rede de proteção. Em casos graves, como a exploração sexual, que é gravíssima, pode ocorrer inclusive que a criança não fique mais com os pais”, explica Padilha Guimarães.

Para denunciar casos de trabalho infantil, acesse ipetrabalhoinfantil.trabalho.gov.br ou ligue para o Disque 100.

Fonte: O Tempo

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