O Centro Nacional de Cidadania Negra (CENEG) nasceu nas dependências da Fundação Palmares, como uma proposta nacional de políticas públicas voltadas à inclusão educacional
O Centro Nacional de Cidadania Negra (CENEG) nasceu nas dependências da Fundação Palmares, como uma proposta nacional de políticas públicas voltadas à inclusão educacional, com cortes em etnia e gênero. Iniciou as suas atividades em 2001, com a UNB, traçando o projeto em 10 estados brasileiros. Com a doação de área para essa ONG em Uberaba, a cidade tornou-se a sede nacional do programa. O ex-ministro da Cultura Francisco Wefford veio a Uberaba, juntamente com Carlos Moura, à época presidente da Fundação, e o deputado Narcio Rodrigues, idealizador do projeto, para lançarem o início das obras. Os cursos ministrados nessa instituição eram de inclusão digital, artes, reforço escolar, esportes, pré-vestibular e qualificação de professores, para tratar do tema cultural afro-brasileiro. Mais de 30.000 alunos passaram pelos cursos do CENEG, espalhados em MG, SP, RJ, MT, RS, GO, PA.
O senador Paulo Paim, os deputados Jovair Andrade e Erundina, visitaram os cursos e as instalações da ONG na Univerdecidade. Assim, o CENEG cumpria com os seus objetivos de inclusão social, até ser surpreendido por uma política perseguitória, articulada pela Fundação Palmares, que havia mudado a direção, e não mais admitia o projeto nacional de políticas de inclusão da comunidade negra, em detrimento a Salvador. Optaram, portanto, por jogar na lata de lixo o CENEG. A luta ideológica sepultou a conclusão da construção; já prontos o estúdio de gravação, o laboratório de informática, de música, as salas de aulas, e já iniciadas a biblioteca e o teatro, em área de 40mil m². À época, afirmaram que o nosso pré-vestibular inexistia e os cursos ministrados eram de baixa qualidade. Esqueceram que vários de nossos alunos (as) entraram na faculdade, e se existem rotas de prostituição infantil, talvez muitas dessas adolescentes pudessem estar sob o abrigo do CENEG, estudando.
Se a questão era com a direção, que deixassem à ONG sobreviver, perseguissem unicamente a mim. Mas não, optaram por fragilizar os despossuídos, acreditando que me derrotariam. Derrotaram-me temporariamente, pois a minha honra permanece. Tenho uma história e, com ela, a coragem necessária para enfrentar adversidades e adversários, esses que levantaram uma série de acusações contra mim. Digo que não há dor maior do que a calúnia, ela desestabiliza nossa relação com o mundo, nos afoga em mágoas e nos passa a sensação de que as coisas não se movem, exceto para nos emparedar na má sorte de estarmos vivos. É um sentimento impossível de ser compartilhado, porque perdemos o rumo entre a vergonha e vontade de lutar sem saber por onde, e os nossos algozes se valem do fato de não serem visíveis, como nós.
Mas é preciso ter forças. O estado de direito sempre prevalece onde a perseguição e a calúnia se apresentarem como portadoras da verdade para imputar a difamação. Por crer nisso, nunca perdi as esperanças de poder ser ouvido e de ver os meus acusadores também o serem. Finalmente, aconteceu: a justiça federal começa a analisar todo o processo, com a sua isenção e sem se curvar aos atropelos políticos. Só não podemos, infelizmente, recuperar o que está perdido. Foram lideranças da nossa comunidade negra que se empenharam em enterrar o CENEG. Ou porque não atentaram às nossas políticas sociais, ou porque se deixaram levar por interesses menores do que os de um projeto cujos vitoriosos seríamos todos nós.
(*) professor