Um cidadão em Brasília denunciou ao Conselho Nacional de Educação (CNE), o livro “Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato, sob a alegação de que é uma obra carregada de estereótipos sociais, enfim, é racista. Pasme, o CNE acatou a denúncia, determinando que a obra literária seja proibida nas escolas públicas, excluindo-a do Programa Nacional Biblioteca na Escola.
Desconheço quem seja esse cidadão, talvez seja alguém que vê racismo em tudo; decerto, não deve ser educador. Agora, quem compõe o Conselho Nacional de Educação atua no ramo ou entende dessa questão, portanto, estamos tratando de uma ação que interessa à questão educacional do país. Do caminhar da censura à imprensa até a inquisição literária é uma estrada perigosa para a democracia, porque traduz o cerceamento do conhecimento pela censura, não permitindo, assim, que o censo crítico seja aguçado pelo debate na divergência, sepulta a literatura social e as reflexões históricas pertinentes. O CNE tem o dever de impedir a entrada de livros didáticos equivocados nas escolas e obras literárias contemporâneas que cultivem preconceitos.
É inadmissível que um professor ou escritor, ao externar os seus pensamentos, peque pela intolerância, propague o racismo. Diferentemente, deve ser a leitura de obras literárias de décadas de 30 ou de 50. Algumas obras, como as “Caçadas de Pedrinho”, são fontes de conhecimento das perspectivas sociais de seu tempo. O mesmo se pode dizer de “Os Sertões” – Euclides de Cunha. Devemos lê-las com os olhos no passado, compreendendo o processo histórico, atualizando-as com a crítica contemporânea.
É assim que cultivamos a crítica possibilitando o conhecimento. Se essa ideia de censurar obras do passado, porque elas não coadunam com o pensamento atual, teremos que preparar uma fogueira e atirar obras literárias e letras musicais que falem de “cabelo duro”, “boi da cara preta”, “neguinha assanhada”, sem compreender que essas produções culturais traduzem o caldo cultural daquela sociedade.
É a tal mania do censor achar que a história se inicia na sua censura, que não há, paradoxalmente, história, que tudo é pré-história. Quando a questão racial deixa de ser uma luta pela igualdade e passa a ser um patrulhamento é porque alguns sobrevivem do conflito, sendo preciso, portanto, acirrá-lo.
Comungo com o pensamento do deputado Aldo Rebelo – PC do B – quando afirma em artigo sobre esse tema, no Jornal a Folha de São Paul “ O caráter pernicioso dessas iniciativas – referindo-se à decisão do CNE – não se esgota no campo literário. Decorre do erro do multiculturalismo, que reivindica a intervenção do Estado para autonomizar culturas, como se fossem minorias em pé de guerra com a sociedade nacional”.
Lamento que o CNE, parecerista da lei que instituiu a história do Negro e da África como conteúdos escolares, se curve aos interesses subjetivos em detrimento da educação e da formação ética da sociedade brasileira. Ou, talvez, não tenha se curvado, e seja mais um aparelho ideológico daqueles que querem racializar a sociedade brasileira.
(*) professor gilcaixeta@terra.com.br