A sensibilidade humana é um dom que possibilita a prática da misericórdia, o sentimento de compaixão mediante a fragilidade e miséria do outro. É também exercício de solidariedade para com a pessoa alheia ao encontrá-la no desespero e sofrimento. Assim é a misericórdia divina, porque a identidade revelada de Deus mostra a marca da acolhida e do perdão oferecidos aos que o procuram.
Na realidade brasileira, com tamanha instabilidade política, cultural, econômica e religiosa, a distância entre o pobre e o rico cada vez maior, o que pode evitar conflitos é a capacidade de misericórdia e ação concreta de partilha. Existe muito desespero no meio do povo na espera dos gestos de compaixão. A forte idolatria do poder e do acúmulo não pode continuar sacrificando vidas desassistidas.
A sabedoria de Deus acontece através de valores, da prática da justiça e da misericórdia, fatos fundamentais para preservar a vida das pessoas. É muito difícil conseguir entender o avanço do progresso na tecnologia, a chegada revolucionária do sistema virtual do 5G, com orçamentos bilionários no país e ver grande parte da população sem ter como viver com dignidade e mergulhada na miséria.
Misericórdia significa vitória diante das forças de opressão e morte, ânimo e vida com esperança. As pessoas têm bondade no coração, mas precisam ser motivadas para os gestos daquele bom samaritano do Evangelho. Falamos das obras de misericórdia: dar de comer a quem tem fome, vestir os nus, dar pousada aos peregrinos, assistir aos enfermos, visitar os presos e enterrar os mortos.
Num mundo de idolatrias, injustiças, profundas tensões e muito desânimo, praticamente não há outro caminho para conquistar valores humanos, que não passe pela prática concreta e cristã da misericórdia. Não é um trajeto de poder e ter, mas reconhecimento de fragilidades que fazem parte dos limites do ser humano. Todo ato de misericórdia engrandece e eleva a vida dos indivíduos.
O termo “misericórdia” tem feito profunda ressonância nas palavras do Papa Francisco, que vê o futuro do mundo em perigo se não houver gestos concretos de compaixão, perdão e misericórdia. Concluímos que dessas atitudes emerge a esperança e conseguimos enxergar uma sociedade que tem como projeto o bem comum, a construção da fraternidade universal assentada na justiça.
Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba