Na minha infância, a família se reunia à noite, em volta do rádio, para ouvir algum programa musical ou humorístico.
E lá pelas tantas, alguém reclamava: “Mãe, estou com fome!” Não era uma fome canina, mas vontade de mastigar alguma coisa. Sem se fazer de rogada, dona Joaquina, minha mãe, se dirigia para a cozinha e logo estava de volta com um delicioso cafezinho e apetitosos biscoitos de polvilho.
Entretanto nem sempre o polvilho estava à mão e, na falta de ingredientes para alguma iguaria, o negócio era apelar para a jacuba. Podia não ser a melhor opção para enganar o estômago, porém a jacuba matava qualquer fome.
Preparávamos a jacuba sempre misturando, em uma chávena, farinha de mandioca com açúcar. E, por cima de tudo, água. Era mexer, mexer, mexer e apreciar. Verdadeira paulada na fome de todos e garantia de uma noite bem dormida.
Para acabar com a vontade de comer, hoje em dia, basta uma ida à praça ou à esquina e lá está um quiosque com cachorro-quente e outros tantos sanduíches à disposição. Melhor ainda é a variedade de pizzas prontas entregues em casa.
Mas o tempo da jacuba era bem outro. E poucas casas tinham telefone. E, mesmo com telefone, não seria possível encomendar pizzas, pois não havia, pelo interior, pizzarias disponíveis.
Segundo o Houaiss, jacuba é “1. papa de farinha de mandioca preparada com mel, açúcar ou rapadura, a que se acrescenta, por vezes, leite ou cachaça e que também se dilui com água e sumo de limão, para servir como refresco; 2. café quente engrossado com farinha de mandioca”...
Mel, rapadura, leite, limão e café não fizeram parte da nossa jacuba doméstica. E muito menos, cachaça. A receitinha de matar a fome era só esta: farinha de mandioca, açúcar e água.
Falando em rapadura e café, nos tempos de guerra, para adoçar o café, a rapadura substituiu o açúcar, que estava racionado. De vez em quando o açúcar mascavo também tinha esse fim. Quem passou por esses tempos difíceis não os esquece.
Talvez eu faça uma jacuba por estes dias, só pelo gosto de matar a fome com a saudade... que tanto maior fica quanto mais passa o tempo.
(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro