ARTICULISTAS

Lá se foi minha madrinha

Conheci Dona Terezinha em meados dos anos 90

Vera Lúcia Dias
veludi@terra.com.br
Publicado em 30/05/2014 às 19:42Atualizado em 19/12/2022 às 07:33
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Conheci Dona Terezinha em meados dos anos 90 pelos caminhos profissionais, surgindo daí um conhecimento muito respeitoso.

De lá para cá, a vida encarregou-se de pontuais encontros até que começo a receber seus sistemáticos convites para participar das reuniões mensais da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, onde, enquanto presidente, me incentivou o suficiente para lançar meu primeiro livro.

À moda dos partos antigos, participou ativamente desse processo, orientando e indicando caminhos, e o fato é que, se não foi a parteira, foi pelo menos a madrinha de minha consagração como escritora. Tanto que a ela coube fazer a apresentação de meu livro na cerimônia de lançamento, e o fez com a elegância própria de todas as suas ações.

Ainda por convite seu, viajamos com o grupo de acadêmicos por dois anos consecutivos para participar do Festival de Inverno de Jaguara, ocasiões em que nossa amizade foi se fortalecendo e é claro que, em nossas conversas, a saudade do seu Murilo sempre se fazia presente.

Não era uma saudade raivosa ou revoltada. Muito pelo contrário, era uma saudade serena e esperançosa na certeza do reencontro.

Aliás, diga-se, não de passagem, mas com ênfase, que serenidade era a marca registrada de Dona Terezinha, que não se abateu nem diante das últimas e difíceis provas, conforme demonstrou em seus últimos escritos.

O que dizer dessa personagem que nunca gerou controvérsias em sua imagem pública? Uma edição inteira do jornal não seria suficiente para retratar o legado que nos deixou.

O que dizer para seus familiares? Não encontro em meu repertório as palavras que me pareçam adequadas para amenizar a lacuna que devem estar experimentando.

E, na ausência de palavras minhas, utilizo as dela, retiradas de sua crônica “Voo sem asas”, que, não sei explicar por qual tipo de coincidência, estava com o marcador de leitura no seu livro “Seguir Adiante”:

“Sem ter asas, às vezes a alma voa. E, no voar, emaranha-se no des-preocupar-se com as perturbações do aqui e agora. Voo parado. Sem movimento. Como se um branco enevoasse perguntas e apagasse respostas. Voo de nada querer ser ou saber. De não sentir quaisquer espécies de vazios. Muito menos de saciedade.

Pairar apenas. A alma leve, como que adormecida no embalo da própria existência – também na pausa de não seguir. Sem ver começo ou fim. Sem ver limites cerceando investidas. Sem ver a (des)necessidade de perscrutar dúvida ou acender certezas. Sem angústias inerentes à sempre conflitante essência humana com suas ambições, anseios, desvarios, gritos e silêncios.

Pairar apenas, naquele voo sem asas, sem ruflar de asas, sem movimento, apenas momento de paz, como no abraço silencioso, como ser amada, sem palavras, de ternura calada...”.

Não pude ir lhe dar meu adeus final. Nossos amigos comuns confiaram nas redes sociais, mas fica aqui o meu desej Que você voe em paz para os braços de seu amado Murilo.

(*) Professora e mestre em Psicologia Clínica; presidente do Instituto Renovare/Cemae (Centro de Estudos Sobre a Morte e Apoio a Enlutados)

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