Após décadas de luta do movimento antimanicomial, os portadores de transtornos mentais
Após décadas de luta do movimento antimanicomial, os portadores de transtornos mentais não mais permanecem internados em regime definitivo. Ou seja, inexiste o sistema do antigo manicômio. Mas essa história da loucura, sobreposição de ficções que rende gênios e malditos, é longa. No Brasil, vem desde o período colonial aos nossos dias, com mudanças metodológicas no trato dos sintomas da loucura.
Por ser uma questão complexa, tem sido abordada com prismas os mais diferentes ao longo dos tempos. Até mesmo a Inquisição – que aqui se chamava Visitação – instruia os membros do Santo Ofício a diferenciar os “doudos” de um blasfemo. Aos poucos, os doidos que perambulavam pelas ruas das capitais, especialmente no Rio de Janeiro, iam sendo confinados nos manicômios e submetidos a tratamentos radicais, como choques, lobotomias... Difícil tarefa humana de aprender a lidar com esse enigma da espécie humana.
Diferentemente de nós, a Fundação Gregório Baremblit vem dando mostras de sua competência e de seu pertencimento na luta antimanicomial no tratamento daqueles que têm sofrimentos mentais. Essa fundação conta com pessoas humanizadas e capacitadas à frente de sua direção e com colaboradores atentos para tratar desse tema. Inclusive, eles envolvem a sociedade nesta luta, instruindo-nos, e, por conseguinte, desmitificando o tema de que o louco é um ser improdutivo e que só causa danos e incômodos à sociedade, quiçá à família.
Em épocas pregressas, o manicômio no Brasil contou com a presença de artistas criativos em seus quadros de internos. Lima Barreto – o escritor de Triste Fim de Policarpo Quaresma –, ao dar entrada no hospício pela polícia, foi registrado como indigente e ali escreveu o Diário do hospício, peça exemplar dos tratamentos a que eram submetidos os loucos, mesmo sendo indigente e alcoólatra. Outros artistas se expressaram nos corredores do manicômio, a exemplo de Arthur Bispo do Rosário, que teceu, a partir de fios retirados de seu uniforme de interno, um manto para ser usado no juízo final. A obra do artista interno Emygio é rica e de uma autenticidade surpreendente. Vários pacientes tiveram suas obras reconhecidas por seu valor artístico. O quadro de Fernando Diniz foi vencedor de concurso em Paris.
Essas expressões deixaram de ser naturais para se tornarem estratégias a partir da psiquiatra Nise da Silveira, onde os pacientes transformam loucura em arte, exorcizando seus delírios em telas e esculturas. Aqui em Uberaba há ações propositivas neste sentido. Temos artistas enclausurados em si se libertando através da arte e, por conseguinte, buscando a cura.
Que a luta antimanicomial persista e que os profissionais que se dedicam ao tema tenham suas esperanças sustentadas pelos órgãos públicos e pelos familiares. Porque a vida é doida demais para ser vivida sozinha e enclausurada.
(*) professor