Meu irmão Alberto, numa lanchonete, em Portugal, pede um copo d´água. A resposta da atendente veio de imediat “O senhor quer dizer que deseja um copo com água?”. Foi uma resposta lógica. Dentro dos enquadramentos lógicos, foi uma resposta óbvia. Uma resposta correta. Provavelmente, aquela moça não quis “fazer gracinha”. Estava apenas sendo lógica.
Dias depois, a mesma pessoa, num restaurante, no Porto, pergunta ao garçom se eles tinham uísque. A resposta foi afirmativa. Como o uísque demorasse, reclamou. A resposta do garçom foi lógica: “O senhor não pediu a bebida, só perguntou se nós tínhamos”. Uma resposta óbvia.
Viajando de uma cidade para outra, como demorasse, perguntou ao motorista: “Não há um atalho por aqui?”. “Há sim, mas este atalho dá muitas voltas.”
Há muitos anos, aqui em Uberaba, um bispo e um gramaticista trocaram farpas e “carinhos” em artigos semanais. O assunto era muito importante para a salvação da pátria: “A língua portuguesa tem ou não tem lógica?”. Para o gramático, não havia lógica em língua nenhuma. Para o bispo, havia. Depois de muitas semanas e depois de muita briga, ninguém ficou sabendo se havia ou não lógica na língua e, muito menos, naquela troca de amabilidades. Se fizessem um tratamento psicológico seria bem mais proveitoso.
Deve ser difícil conviver com pessoas lógicas. Essa gente só fala o que é óbvio. O mundo lógico é, como dizia Nietzsche, “o mais frio de todos os monstros frios”. Os lógicos tiram o encanto da vida. A característica do lógico é ser quadrado. É eliminar a surpresa. De um modo geral, o lógico não tem nenhum pendor para a poesia. É incapaz de entender o “sentido oculto” de um poema. O importante para ele é a rima. Se rimou, é poesia. Se não dá para contar as sílabas nos dedos, não é poesia. O lógico é incapaz de um entretenimento poético. Não sabe o que é um enlevo artístico. Não percebe a harmonia interior de um poema, mesmo daqueles de Drummond que têm jeito de prosa. Diante de um quadro de Van Gogh, reclama: “Esse amarelo está forte demais”. Diante de uma tela de Monet, vai logo dizend “Até eu faço isso, esses borrões aí”.
Pior, o lógico se irrita com o modo de ser espontâneo das pessoas. Para ele, o que importa é ser racional e, por isso, se perde em pensar e repensar consequências. Para ele, os que se deixam guiar pelo coração, pela afetividade, são ridículos. O que vale é a interpretação cartesiana da vida. E assim vai deixando-se guiar pelos silogismos. Seu raciocínio é frio. Estou me lembrando de um famoso técnico de futebol, instruindo seus jogadores: “Vence o jogo quem marca mais gols; ora, vocês não marcam gols; logo não vencem o jogo”.
Deve ser sumamente penoso viver num mundo de pessoas lógicas. Deve ser um sufocante amontoado de leis frias. Um mundo sem cor, sem música, sem poesia, sem sol, sem estrelas. Mundo lógico é um mundo sem amor. Se existe amor, é ele regulado por leis preestabelecidas. Há certas pessoas que pensam amar a Deus só porque não amam ninguém. Tudo muito árido. Você já pensou que o amor (não importa que amor) é uma deslumbrante e acolhedora falta de lógica? Será que existe um amor matemático?
Saint-Exupéry conta a história de um rei que passava o dia fazendo contas: dois mais dois, quatro; quatro mais quatro, oito... e assim por diante. Quando tentaram perguntar-lhe o por quê, ele respondeu: “Je suis sérieux” ("Eu sou um homem sério"). O pequeno planeta em que vivia era um planeta muito triste.